A Fé Ativa construindo uma Nova Era 19
Módulo/Eixo Temático: A Fé Ativa
O Livre Pensamento e a Livre
Consciência
(Allan Kardec, in “Revista Espírita”
– fev./1867)
Num artigo de
nosso último número (página 6), intitulado: Golpe de vista retrospectivo sobre
o movimento do Espiritismo, fizemos duas classes distintas dos livres
pensadores: os incrédulos e os crentes, e dissemos que, para os primeiros, ser
livre pensador não é somente crer naquilo que se quer, mas não crer em nada: é
se libertar de todo freio, mesmo do medo de Deus e do futuro; para os segundos,
é subordinar a crença à razão e se libertar do jugo da fé cega.
Estes últimos têm
por órgão de publicidade a Livre consciência, título significativo; os outros,
o jornal o Livre pensamento, qualificação mais vaga, mas que se especializa
pelas opiniões formuladas, e que vêm, de todos os pontos, corroborar a
distinção que fizemos. Ali lemos no n-2 de 28 de outubro de 1866:
"As questões
de origem e de fim preocuparam até aqui a Humanidade, a ponto, frequentemente,
de perturbar sua razão. Estes problemas que se qualificaram de terríveis, e que
cremos de importância secundária, não são do domínio imediato da ciência. Sua
solução científica não pode oferecer senão uma meia certeza. Tal qual é, no
entanto, ela nos basta, e não tentaremos completá-la por argúcias metafísicas.
O nosso objetivo é, aliás, de não nos ocuparmos senão dos assuntos abordáveis
pela observação. Entendemos permanecer sobre a Terra. Se, às vezes, dela nos
afastamos para responder aos ataques daqueles que não pensam como nós, a
excursão fora do real será de curta duração. Teremos sempre presente ao
pensamento este sábio conselho de Helvétius: "É preciso ter a coragem de
ignorar o que não se pode saber."
"Um novo
jornal, a Livre consciência, nossa primogênita de alguns dias, como o fez
notar, nos deseja a boa vinda em seu número de amostra grátis. Nós lhe
agradecemos pelo modo cortês pelo qual usou de seu direito de primogenitura.
Nosso confrade pensa que, apesar da analogia dos títulos, não estaremos sempre
em "completa afinidade de ideias". Nós, depois da leitura de seu
primeiro número, disto estamos certos; não compreendemos mais a livre
consciência do que o livre pensamento com um limite dogmático assinalado
antecipadamente. Quando sede clara claramente discípulo da ciência e campeão da
livre consciência, é irracional, em nossa opinião, colocarem seguida como um
dogma uma crença qualquer, impossível de provar cientificamente. A liberdade
limitada da sorte não é a liberdade.
De nosso turno,
desejamos as boas-vindas à Livre consciência, e estamos dispostos a ver nela
uma aliada, uma vez que declara querer combater por todas as liberdades...
menos uma."
É estranho ver
considerar a origem e o fim da Humanidade como questões secundárias próprias
para perturbar a razão. Que se diria de um homem que, vivendo o dia-a-dia, não
se inquietasse de como viverá amanhã? Passaria por um homem sensato? Que se
pensaria daquele que, tendo uma mulher, filhos, amigos, dissesse: Que me
importa que amanhã estejam mortos ou vivos! Ora, o dia seguinte da morte é
longo; não é preciso, pois, se admirar que tanta gente com isto se preocupe.
Se se fizesse a
estatística de todos aqueles que perdem a razão, ver-se-ia que o maior número
está precisamente do lado daqueles que não creem nesse dia seguinte ou que dele
duvidam, e isto, pela razão muito simples de que a grande maioria dos casos de
loucura é produzida pelo desespero e a falta de coragem moral que faz suportar
as misérias da vida, ao passo que a certeza desse dia seguinte torna menos
amargas as vicissitudes do presente, e as faz considerar como incidentes
passageiros, cujo moral não se afeta senão mediocremente ou nada se afeta. Sua
confiança no futuro lhe dá uma força que jamais terá aquele que não tem por
perspectiva senão o nada. Ele está na posição de um homem que, arruinado hoje,
tem a certeza de ter amanhã uma fortuna superior àquela que acaba de perder.
Neste caso, toma facilmente seu partido, e permanece calmo; se, ao contrário,
ele nada espera, se desespera e sua razão pode sofrer com isto.
Ninguém contestará
este princípio: saber dia por dia de onde se vem e para onde se vai, o que se
fez na véspera e o que se fará amanhã, não seja uma coisa necessária para
regular os negócios diários da vida, e que ela não influi sobre a conduta
pessoal. Seguramente o soldado que sabe para onde se o conduz, que vê seu
objetivo, marcha com mais firmeza, com mais vivacidade, mais entusiasmo do que
se o conduzisse às cegas. Ocorre assim do pequeno ao grande, da individualidade
ao conjunto; saber de onde se vem e para onde se vai não é menos necessário
para regular os negócios da vida coletiva da Humanidade. No dia em que a
Humanidade inteira tiver a certeza de que a morte é sem saída, ver-se-á uma
confusão geral, e os homens se lançarem uns sobre os outros, dizendo: Se não
deveremos viver senão um dia, vivamos o melhor possível, não importa às
expensas de quem!
O jornal o Livre
pensamento declara que entende permanecer sobre a Terra, e que, se disto sai às
vezes, é para refutar aqueles que não pensam como ele, mas que suas excursões
fora do real serão de curta duração.
Compreenderíamos
que assim o fosse com o jornal exclusivamente científico, tratando de matérias
especiais; é evidente que seria intempestivo falar de espiritualidade, de
psicologia ou de teologia a propósito de mecânica, de química, de física, de
cálculos matemáticos, de comércio ou de indústria; mas desde que faz entrar em
seu programa a filosofia, não poderia enchê-la sem abordar as questões
metafísicas. Se bem que a palavra filosofia seja muito elástica, e que haja
sido singularmente desviada de sua acepção etimológica, implica, por sua
própria essência, pesquisas e estudos que não são exclusivamente materiais.
O conselho de
Helvetius: "É preciso ter a coragem de ignorar o que não se pode
saber," é muito sábio, e se dirige sobretudo aos sábios presunçosos que
pensam que nada pode ser ocultado ao homem, e o que não sabem ou não
compreendem não deve existir. Seria mais justo, no entanto, dizer: "É
preciso ter a coragem de confessara sua ignorância sobre o que não se
sabe." Tal como está formulado, se poderia traduzi-lo assim: "É
preciso ter a coragem de conservara sua ignorância," de onde esta
consequência: "É inútil procurar saber o que não se sabe." Sem
dúvida, há coisas que o homem não saberá jamais enquanto estiver sobre a Terra,
porque, qualquer que seja a sua presunção, a Humanidade está ainda no estado de
adolescência; mas quem ousaria pôr limites absolutos àquilo que pode saber?
Uma vez que se
sabe disto infinitamente mais hoje do que os homens dos tempos primitivos,
porque, mais tarde, não se saberia mais disto do que se sabe agora? É o que não
podem compreender aqueles que não admitem a perpetuidade e a perfectibilidade
do ser espiritual. Muitos dizem a si mesmos: Estou no cume da escala
intelectual; o que não vejo e não compreendo, ninguém pode vê-lo e
compreendê-lo.
No parágrafo
reportado acima e relativo ao jornal a Livre consciência, está dito: "Não
compreendemos mais a livre consciência que o livre pensamento com um limite
dogmático assinalado antecipadamente. Quando se declara discípulo da ciência, é
irracional colocar como um dogma uma crença qualquer impossível de se provar
cientificamente.
A liberdade
limitada da sorte não é a liberdade."
Toda doutrina está
nestas palavras; a profissão de fé é limpa e categórica. Assim, porque Deus não
pode ser demonstrado por uma equação algébrica, que a alma não é apreensível
com a ajuda de um reativo, é absurdo crer em Deus e na alma. Todo discípulo da
ciência deve, consequentemente, ser ateu e materialista. Mas, por não sair da
materialidade, a ciência é sempre infalível em suas demonstrações? Não se a
tem, muitas vezes, visto dar por verdades o que mais tarde foi reconhecido ser
erros, e vice- versa? Não foi em nome da ciência que o sistema de Fulton foi
declarado uma quimera? Antes de conhecer a lei da gravitação, não demonstrou
ela cientificamente que não podia haver antípodas? Antes de conhecer a da
eletricidade, não demonstrou ela pôr a mais b que não existia velocidade capaz
de transmitir um despacho a quinhentas léguas em alguns minutos?
Tinha-se muito
experimentado a luz, e, no entanto, há poucos anos ainda, quem teria suspeitado
os prodígios da fotografia? No entanto, não foram os sábios oficiais que
fizeram esta prodigiosa descoberta, não mais do que as do telégrafo elétrico e
das máquinas a vapor. A ciência conhece ainda hoje todas as leis da Natureza?
Sabe ela somente todos os recursos que se podem tirar das leis conhecidas? Quem
ousaria dizê-lo? Não se pode que um dia o conhecimento de novas leis torne a
vida extracorpórea tão evidente, tão racional, tão inteligente quanto a dos
antípodas? Um tal resultado interrompendo todas as incertezas, seria, pois, a
desdenhar? Seria menos importante, para a Humanidade, do que a descoberta de um
novo continente, de um novo planeta, de um novo engenho de destruição?
Pois bem! Esta
hipótese se tornou realidade; é ao Espiritismo que se o deve, e é graças a ele
que tantas pessoas que acreditavam morrer uma vez por todas, estão agora certas
de viverem sempre.
Falamos da força
da gravitação, essa força que rege o Universo, desde o grão de areia até os
mundos; mas quem a viu, quem a pode segui-la, analisá-la? Em que consiste ela?
Qual é a sua natureza, a sua causa primeira? Ninguém o sabe, e, no entanto,
ninguém dela dúvida hoje. Como se a reconheceu? Por seus efeitos; dos efeitos
se concluiu a causa; fez-se mais: calculando a força dos efeitos, calculou-se a
força da causa que jamais se viu. Ocorre o mesmo com Deus e com a vida espiritual
que se julga também por seus efeitos, segundo este axioma: "Todo efeito
tem uma causa. Todo efeito inteligente tem uma causa inteligente. A força da
causa inteligente está em razão da grandeza do efeito." Crerem Deus e na
vida espiritual não é, pois, uma crença puramente gratuita, mas um resultado da
observação tão positiva quanto aquela que faz crer na força da gravitação.
Depois, na falta
de provas materiais, concorrentemente a estas, a filosofia não admite as provas
morais que, às vezes, têm tanto e mais valor do que as outras? Vós, que não
tendes por verdadeiro senão o que é provado materialmente, que diríeis se,
estando injustamente acusado de um crime do qual todas as aparências seriam
contra vós, assim como se vê frequentemente a injustiça, os juízes não tivessem
em nenhuma conta as provas morais que seriam em vosso favor? Não serieis o
primeiro a invocá-las? A fazer valer sua preponderância sobre os efeitos
puramente materiais que podem iludir? A provar que os sentidos podem enganar os
mais clarividentes? Se, pois, admitis que as provas morais devem pesar na
balança de um julgamento, não serieis consequente convosco mesmo anegando-lhes
o valor quando se trata de fazer uma opinião sobre as coisas que, pela sua
natureza, escapam à materialidade.
O quede mais
livre, de mais independente, de menos apreensível por sua própria essência, do
que o pensamento? E, no entanto, eis uma escola que pretende emancipá-lo
acorrentando-o à matéria; que avanço, em nome da razão, que o pensamento
circunscrito sobre as coisas terrestres é mais livre do que aquele que se lança
no infinito, e quer ver além do horizonte material! Tanto valeria dizer que o
prisioneiro que não pode dar senão alguns passos em seu cárcere é mais livre do
que aquele que corta os campos. Se, crer nas coisas do mundo espiritual que é
infinito, é não ser livre, vós o sois cem vezes menos, vos que vos
circunscreveis no limite estreito do tangível, que dizeis ao pensamento: Tu não
sairás do círculo que te traçamos, e se t u dele sais não és mais o pensamento
sadio, mas a loucura, a tolice, o disparate, porque só a nós pertence discernir
o falso do verdadeiro.
A isto o
espiritualismo responde: Nós formamos a imensa maioria dos homens da qual sois
apenas a milionésima parte; com que direito vos atribuís o monopólio da razão?
Quereis, dizeis, emancipar nossas ideias em nos impondo as vossas? Mas não nos
ensinais nada; sabemos o que sabeis; cremos sem restrição em tudo o que credes:
na matéria e no valor das provas tangíveis, e mais do que vós: em alguma coisa
fora da matéria; numa força inteligente superior à Humanidade; em causas
inapreciáveis pelos sentidos, mas perceptíveis pelo pensamento; na perpetuidade
da vida espiritual que limitais à duração da vida do corpo. Nossas ideias são,
pois, infinitamente mais amplas do que as vossas; ao passo que circunscreveis
vosso ponto de vista, o nosso abarca os horizontes sem limites. Como aquele que
concentra seu pensamento sobre uma ordem determinada de fatos, que coloca assim
um ponto de parada aos seus movimentos intelectuais, às suas investigações,
talvez pretender emancipar aquele que se move sem entraves, e cujo pensamento
sonda as profundezas do infinito? Restringir o campo de exploração do
pensamento é restringir a sua liberdade, e é o que fazeis.
Quereis, dissestes
ainda, arrancar o mundo do jugo das crenças dogmáticas; fazei pelo menos uma
distinção entre estas crenças? Não, porque confundis na mesma reprovação tudo o
que não é do domínio exclusivo da ciência, tudo o que não se vê pelos olhos do
corpo, em uma palavra, tudo o que é de essência espiritual, por consequência
Deus, a alma e a vida futura. Mas se toda crença espiritual é um entrave à
liberdade de pensar, ocorre o mesmo com toda crença material; aquele que crê
que uma coisa é vermelha, porque a vê vermelha, não é livre para crê-la verde.
Desde que o pensamento é detido por uma convicção qualquer, ele não é mais
livre; para ser consequente com a vossa teoria, a liberdade absoluta
consistiria em nada crer do todo, mesmo na sua própria existência, porque isto
seria ainda uma restrição; mas então em que se tornaria o pensamento?
Considerado deste
ponto de vista, o livre pensamento seria um contra-senso. Ele deve se entender
num sentido mais amplo e mais verdadeiro; quer dizer, do uso livre que se faz
da faculdade de pensar, e não na sua aplicação em uma ordem qualquer de ideias.
Ele consiste, não em crer numa coisa antes do que numa outra, nem em excluir
tal ou tal crença, mas na liberdade absoluta de escolha das crenças. É, pois,
abusivamente que alguns dele fazem a aplicação exclusiva às ideias
anti-espiritualistas. Toda ideia racional, que não é nem imposta, nem encadeada
cegamente à de outrem, mas que é voluntariamente adotada em virtude do
julgamento pessoal, é um pensamento livre, quer seja religioso, político ou
filosófico.
O livre
pensamento, na sua acepção mais ampla, significa: livre exame, liberdade de
consciência, fé raciocinada; ele simboliza a emancipação intelectual, a
independência moral, complemento da independência física; ele não quer mais
escravos do pensamento do que escravos do corpo, porque o que caracteriza o
livre pensador é que ele pensa por si mesmo e não pelos outros, em outras
palavras, que sua opinião lhe pertence particularmente. Pode, pois, haver
livres pensadores em todas as opiniões e em todas as crenças. Neste sentido, o
livre pensamento eleva a dignidade do homem; dele faz um ser ativo,
inteligente, em lugar de uma máquina de crer.
No sentido
exclusivo que alguns lhe dão, em lugar de emancipar o espírito, ele restringe a
sua atividade, faz dele escravo da matéria, os fanáticos da incredulidade
fazem, num sentido, o que os fanáticos da fé cega fazem num outro; quando estes
dizem: Para ser segundo Deus é preciso crer em tudo o que nós cremos; fora de
nossa fé não há salvação, os outros dizem: Para ser segundo a razão, é preciso
pensar como nós, não crer senão no que cremos; fora dos limites que traçamos à
crença, não há nem liberdade nem bom senso, doutrina que se formula por este
paradoxo: Vosso espírito não é livre senão com a condição de não crer naquilo
que quer, o que vem a dizer a um indivíduo: Tu és o mais livre de todos os
homens, com a condição de não ir mais longe do que o fim da corda à qual vos
prendemos.
Seguramente não
contestamos aos incrédulos o direito de não crer em nada senão na matéria, mas
convir-se-á que há singulares contradições em sua pretensão de se atribuir o
monopólio da liberdade de pensar.
Dissemos que pela
qualidade de livre pensador certas pessoas procuram atenuar o que a
incredulidade absoluta tem de repulsivo para a opinião das massas; suponhamos,
com efeito, que um jornal se intitule abertamente: o Athée, o Incrédula ou o
Matérialiste, pode-se julgar da impressão que esse título faria sobre o
público; mas que abrigue estas mesmas doutrinas sob a capa do livre pensador, a
esta bandeira se diz: É a bandeira da emancipação moral; deve ser o da
liberdade de consciência e sobretudo da tolerância; vejamos. Vê-se que não é
preciso sempre reportá-lo à etiqueta.
Estar-se-ia em
erro, de resto, assustando-se além da medida das consequências de certas
doutrinas; elas podem momentaneamente seduzir alguns indivíduos, mas jamais
seduzirão as massas que lhe são opostas pelo instinto e pela necessidade. É
útil que todos os sistemas se mostrem à luz, para que cada um possa deles
julgar o forte e o fraco, e, em virtude do direito de livre exame, possa
adotá-los ou rejeitá-los com conhecimento de causa. Quando as utopias forem
vistas em ação, e que terão provado sua impotência, elas cairão para não mais
se levantar. Por seu próprio exagero, elas movimentam a sociedade e preparam a
renovação. Está ainda aí um sinal dos tempos.
O Espiritismo é,
como alguns o pensam, uma nova fé cega substituindo a uma outra fé cega; de
outro modo dito, uma nova escravidão do pensamento sob uma nova forma? Para
crê-lo é preciso ignorar-lhe os primeiros elementos.
Com efeito, coloca
como princípio que antes de crer é preciso compreender; ora, para compreender é
preciso fazer uso de seu julgamento; eis porque ele procura se dar conta de
tudo antes de nada admitir, em saber o porquê e o como de cada coisa; também os
Espíritas são mais suscetíveis do que os outros com relação aos fenômenos que
saem do círculo das observações habituais. Ele não repousa sobre nenhuma teoria
preconcebida e hipotética, mas sobre a experiência e a observação dos fatos; em
lugar de dizer: "Crede primeiro, e compreendais em seguida, se o
puderdes," ele diz:
"Compreendei
primeiro e crereis em seguida se o quiserdes." Ele não se impõe a ninguém;
diz a todos: "Vede, observai, comparai e vinde a nós livremente se isto
vos convém." Assim falando, ele se candidata e corta as chances da
concorrência. Se muitos vão a ele, é que os satisfaz muito, mas ninguém o
aceita de olhos fechados. Àqueles que não o aceitam, ele diz: "Sois livres,
e não vos quero; tudo o que vos peço, é de deixar-me a minha liberdade, como
vos deixo a vossa. Se procurais me afastar, pelo medo de que vos suplante, é
que não estais muito seguros de vós."
O Espiritismo não
procurando afastar nenhum dos concorrentes na liça aberta às ideias que devem
prevalecer no mundo regenerado, e nas condições do verdadeiro livre pensamento;
não admitindo nenhuma teoria que não esteja fundada sobre a observação, ele
está, ao mesmo tempo nas do mais rigoroso positivismo; tem, enfim, sobre seus
adversários de duas opiniões contrárias extremas, a vantagem da tolerância.
Nota. Algumas
pessoas nos censuraram pelas explicações teóricas que, desde o princípio,
procuramos dar dos fenômenos espíritas. Essas explicações, baseadas sobre uma
observação atenta, remontando dos efeitos à causa, provavam, de uma parte, que
queríamos nos dar conta e não crer nelas cegamente; de outra, que queríamos
fazer do Espiritismo uma ciência de raciocínio e não de credulidade. Por essas
explicações que o tempo desenvolveu, mas que consagrou em princípio, porque
nenhuma foi contraditada pela experiência, os Espíritas acreditaram porque
compreenderam, e não é duvidoso que é a isto que se deve atribuir o crescimento
rápido do número dos adeptos sérios.
É a essas
explicações que o Espiritismo deve por ter saído do domínio do maravilhoso e de
estar ligado às ciências positivas; por elas demonstrou aos incrédulos que isto
não é uma obra de imaginação; sem elas estaríamos ainda para compreender os
fenômenos que surgem a cada dia. Era urgente colocar, desde o princípio, o
Espiritismo sobre o seu verdadeiro terreno. A teoria fundada sobre a
experiência foi o freio que impediu a credulidade supersticiosa, tanto quanto a
malevolência, de fazê-lo desviar de seu caminho. Porque aqueles que nos
censuram por termos tomado a iniciativa, não a tomaram eles mesmos?