Que dedução se pode
tirar do sentimento instintivo, que todos os homens trazem em si, da existência
de Deus?
A de que Deus
existe; pois, donde lhes viria esse sentimento, se não tivesse uma base? É
ainda uma conseqüência do princípio - não há efeito sem causa.
Questão nº 5, de O
Livro dos Espíritos
Se seu pai, prezado
leitor, já se transferiu “desta para melhor”, além das sombras do sepulcro,
talvez você não esteja em condições de um contato feliz, facultado pela
vidência mediúnica.
Pode faltar-lhe,
também, suficiente sensibilidade para perceber-lhe a presença, em eventual
visita que lhe faça, pois os que vivem lá não esquecem os que vivem cá.
Mas, elementar
exercício de raciocínio, ao alcance de qualquer criança, lhe dirá que tem um
pai, como toda gente. Seria altamente improvável que você houvesse surgido das
profundezas do nada...
E o coração lhe
dirá, quando se disponha a ouvi-lo, que o seu pai continua a existir, não
apenas na sua saudosa lembrança, mas como individualidade imortal que dos
etéreos horizontes espirituais permanece ligado a você.
É o que ocorre em
relação a Deus.
Há algo de
intuitivo que brota do mais íntimo de nossa personalidade, refletindo milenares
experiências religiosas, a nos dizer que Deus existe!
O ateísmo, por isso,
é uma aberração. Não passa de mera pretensão da intelectualidade vazia
intoxicada pelo orgulho.
No livro Trovadores
do Além, psicografia de Francisco Cândido Xavier, o poeta Alberto Ferreira nos
oferece ilustrativa trova:
Ateu - enfermo que
sonha
Na ilusão em que
persiste,
Um filho que tem
vergonha
De dizer que o pai
existe.
***
Em Espíritos
evoluídos a consciência da presença de Deus é tão intensa que se manifesta
desde as experiências mais singelas da infância.
No prefácio do
livro Renúncia, psicografia de Francisco Cândido Xavier, o Espírito Emmanuel
reporta-se aos seus primeiros contatos com Alcione, a personagem central da
história.
Ainda uma menina,
caminhava com o Padre Damiano, bondoso sacerdote que a orientava.
Com encantadora
simplicidade, perguntava-lhe:
– Padre Damiano,
quem terá feito as nuvens, que parecem flores grandes e pesadas, que nunca
chegam a cair no chão?
– Deus – minha
filha – dizia o sacerdote.
Mas,
como se no coração pequenino não devesse existir esquecimento das coisas simples
e humildes, voltava ela a interrogar:
– E as pedras? -
quem teria feito as pedras que seguram o chão?
– Foi Deus também.
Então, após meditar
de olhos mergulhados no grande crepúsculo, a pequenina exclamava:
– Ah! como Deus é
bom! Ninguém ficou esquecido!
E era de ver-se a
sua bondade singular, o interesse pelo dever cumprido, dedicação à verdade e ao
bem.
Sobre sua atuação
inesquecível, na edificação de afeiçoados seus, destaca Emmanuel:
Creio mesmo que ela
nunca satisfez a um desejo próprio, mas nunca foi encontrada em desatenção aos
desígnios de Deus. Jamais a vi preocupada com a felicidade pessoal; entretanto,
interessava-se com ardor pela paz e pelo bem de todos. Demonstrava cuidado
singular em subtrair, aos olhos alheios, seus gestos de perfeição espiritual,
porém queria sempre revelar as idéias nobres de quantos a rodeavam, a fim de os
ver amados, otimistas, felizes.
Alcione foi um anjo
encarnado, em trânsito pela Terra, com a tarefa gloriosa de ajudar a um grupo
de Espíritos ligados ao seu coração.
A nobreza de
caráter que a distinguia e sua estreita sintonia com os ensinamentos de Jesus
fariam dela uma figura inesquecível, beneficiando a todos os que cruzavam seu
caminho com valores de um conhecimento espiritual incomparável e de comovente
dedicação ao próximo.
Era ela própria a
representação marcante da presença de Deus.
***
Curiosamente,
encontramos pessoas de boa índole, generosas e esclarecidas que, não obstante,
por razões inabordáveis, mostram-se incapazes de reconhecer essa realidade.
Tendo em vista seus
méritos, Deus vem em seu auxílio, oferecendo-lhes experiências renovadoras, que
surgem à maneira da Estrada de Damasco que marcou a conversão de Paulo de Tarso
ao Cristianismo.
A propósito há a
edificante história de um farmacêutico, dono de uma farmácia de manipulação.
Era um homem bom,
cumpridor de seus deveres, de princípios retos, mas que simplesmente não
encontrava espaço em suas cogitações íntimas para a existência de Deus.
Certa feita,
fechava mais cedo a farmácia, em virtude de um compromisso, quando entrou uma
menina.
– Sinto muito,
minha filha. Estou de saída...
– Por favor, senhor
farmacêutico, é muito importante. Trago uma receita para minha mãe. Está
gravemente enferma. Deve tomar o remédio imediatamente. Corre risco de vida!
Vendo-a tão aflita,
o farmacêutico decidiu atendê-la.
Apanhou a receita,
foi ao laboratório e rapidamente preparou o remédio com a mistura recomendada.
A menina agradeceu
e partiu, apressada.
O bom homem voltou
ao laboratório para guardar o material usado.
Estarrecido,
verificou que na pressa havia trocado vidros, usando uma substância
extremamente tóxica que, se ingerida pela mulher, provocaria sua morte.
Apavorado, correu à
entrada da farmácia, olhou a rua em todas as direções, foi até a esquina... Não
mais viu a menina.
Tentou entrar em
contato com o médico que indicara o medicamento. Não o encontrou.
O tempo passava,
célere. Em breves momentos a menina chegaria em casa.
Atormentado,
sentindo-se na iminência de converter-se num criminoso, matando a pobre mãe com
seu descuido, caiu de joelhos e, erguendo o olhar, falou, suplicante:
– Deus, se você
existe, realmente, ajude-me, por misericórdia! Não quero transformar-me num
assassino!
E derramou-se em
lágrimas, repetindo rogativas àquele Deus em que não acreditava, mas que era
sua última esperança.
Assim ficou por
vários minutos, até que alguém tocou em seus ombros.
Voltou-se e, num
misto de espanto e alívio, viu que era a menina de retorno.
– Ah! senhor
farmacêutico, uma coisa terrível aconteceu. Tão afobada eu estava a correr, na
ânsia de levar o remédio para minha mãe, que caí, não sei como. O vidro
escapou-me das mãos e se espatifou. Não tenho dinheiro para outra receita. Por
favor, atenda-me, em nome de Deus!
O farmacêutico
suspirou emocionado:
-Sim, sim, minha
filha! Fique tranqüila! Eu lhe darei o remédio, em nome de Deus!
Preparou uma nova
receita, agora com infinito cuidado, sem pressa. Entregou o medicamento à
menina.
– Deus lhe pague,
senhor farmacêutico!
– Vá com Deus,
minha filha! Deus a abençoe!
E nunca mais o nome
de Deus saiu de seus lábios, nem de seu coração.
***
No desdobramento de
nossas experiências acabamos todos reconhecendo a Presença Divina. É algo muito
forte em nós. Mesmo entre os piores criminosos e viciados dificilmente encontraremos
gente negando essa realidade.
O problema da
Humanidade, longe de ser o ateu é o à-toa.
Releve-me a
expressão, leitor amigo.
Não pretendo
enquadrá-lo, até mesmo porque o heróico esforço de enfrentar este precário
exercício de literatura espírita situa você acima do mortal comum, este sim,
à-toa no sentido da indolência, da indiferença em relação aos objetivos da
existência humana.
Quando os homens se
derem ao trabalho de refletir um pouco sobre o significado da presença de Deus
nos Universo, a exercitar a Justiça Perfeita, dando a cada um segundo suas
obras, como ensinou Jesus, não mais veremos gente à-toa.
Haverá apenas gente
à toda, em pleno empenho por transformar a crença em Deus numa gloriosa
existência com Deus!
04. SIMONETTI, Richard. O ateu e o à-toa. In.: A presença de Deus.
Bauru: SÃO JOÃO, 1995. cap. 3. FEDERAÇÃO ESPÍRITA DO PARANÁ 7
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