quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Entrevista com Francisco Cândido Xavier

Entrevista com Francisco Cândido Xavier
Livro: Janela para a Vida
Fernando Worm 
 
A entrevista de Fernando Worm é um excerto de um capítulo do livro Janela Para a Vida (Federação Espírita do Rio Grande do Sul, 1979), tendo sido publicada integralmente em PLANETA Especial Chico Xavier.
Você diria que a mediunidade é uma janela voltada para o céu?
Chico Xavier - Se me fosse possível definir a mediunidade, eu diria que ela se parece com uma janela voltada para a vida.
O instrumento da mediunidade tem sido comparado a um telefone. Toca do lado de lá e alguém poderá não atender ao nosso chamado. Às vezes, o chamado vem de lá, mas o aparelho não está em condições de recepção. Esta segunda hipótese ocorre com mais freqüência do que a primeira ou se dá o inverso?
Chico Xavier - A segunda hipótese é muito mais freqüente nas tentativas de intercâmbio espiritual. Entretanto, qual ocorria nas comunidades terrestres de outro tempo, sequiosas por facilidade de comunicação umas com as outras, antes da era do telefone, há que se esperar a época em que os desencarnados consigam recursos mais amplos para a troca de notícias com os irmãos domiciliados no plano físico, a fim de que o problema seja devidamente solucionado.
Ao descrente não será difícil afirmar que o livro psicografado do espírito André Luiz, sob o título Nosso Lar, é pura ficção científica sob enfoque espiritual. Qual a sua opinião?
Chico Xavier - Pessoalmente guardo a convicção de que o livro Nosso Lar nos oferece plena realidade da vida além da morte física. Os contatos mediúnicos com André Luiz e outras entidades da vida maior não me deixam qualquer dúvida quanto a isso.
Certa vez você disse que, se pudesse escolher, optaria por continuar médium após o seu desencarne. Como se processa a mediunidade em sentido inverso, isto é, ser médium do lado de lá para os que ainda estão domiciliados na Terra?
Chico Xavier - Segundo minhas observações modestas, creio que o médium na Terra pode servir aos espíritos que se comunicam cedendo-lhes, provisoriamente, o corpo físico em que se encontra, e pode igualmente prestar-lhes cooperação depois da existência física cedendo-lhes, também provisoriamente, o corpo de natureza espiritual em que se veja nas faixas de trabalho do mais além.
De acordo com renomados meios científicos, a morte clínica de uma pessoa se verifica quando o cérebro deixa de dar registros de atividade cerebral, mesmo que o coração ainda esteja batendo. Do ponto de vista espiritual, em que preciso instante ocorre a desencarnação da alma?
Chico Xavier - A desencarnação não é uma ocorrência absolutamente igual para todos. Por isso mesmo, consideramos por desencarnação o estado do espírito que já se desvencilhou de todos os liames que o prendiam ao corpo material.
Será lícito manter-se uma pessoa viva por recursos inteiramente artificiais quando não reste nem uma só esperança de que essa pessoa possa sobreviver sem tal artificialismo?
Chico Xavier - A ciência na Terra pode, em muitos casos, realizar processos artificiais de retenção do espírito no corpo físico, mas sempre a título precário, sem ligação com as realidades definitivas da vida.
O filósofo Spinoza afirmou: "Um homem livre pensa em último lugar na morte; e sua sabedoria é uma meditação não sobre a morte mas sobre a vida." Em termos espirituais, é certa tal acepção?
Chico Xavier - O filósofo apresenta o enunciado com claras razões, a nosso ver, porquanto o homem que se livrou das amarras da ignorância, refletindo na morte, está meditando na vida, compreendendo, perante a imortalidade, que a morte do corpo físico significa renascimento da vida em outras dimensões vibratórias.
Que dizer daqueles que, mais desapegados da vida, amam a morte na certeza de que ela é a libertação para o espírito?
Chico Xavier - Será justo esclarecer aos que amam a morte, na certeza de que ela expressa libertação, que essa libertação unicamente traduz tranqüilidade e renovação, alegria e progresso quando a criatura humana, dentro de si própria, já se libertou de hábitos e paixões nitidamente inferiores.
O que acontecerá com os líderes religiosos do mundo atual quando ficar cientificamente comprovado ser a reencarnação uma lei tão precisa e inelutável quanto o é, por exemplo, a lei da gravidade? Quando tal ocorrer não haverá modificações profundas no próprio governo terrestre que esteja na administração do planeta?
Chico Xavier - Os princípios da reencarnação, quando forem aceitos pela ciência da Terra, conseguirão liqüidar aflitivas questões do espírito humano; entretanto, são seria justo, de nossa parte, impor a verdade ou exigi-la em bases de violência. Enquanto na experiência física, saibamos recolher da ciência os benefícios que ela nos consiga prestar, sem reclamar-lhe realizações que ela própria considere de caráter prematuro.
Você concorda com a teoria freudiana quando diz que problemas afetivo-sexuais mal resolvidos na infância e na mocidade criam problemas ao longo de toda a existência?
Chico Xavier - A educação do impulso sexual é trabalho não só para a infância e para a juventude, mas para todo o tempo de existência terrestre, continuando além da morte para as inteligências desencarnadas.
Acha válido o dogma psicanalítico que diz que até a idade de 3 ou 4 anos tudo está formado na personalidade da criança, sendo o restante da existência nada mais que uma continuação do que até ali ficou construído dentro dela?
Chico Xavier - Ao que parece, o conteúdo da personalidade, formada na criança, é um testemunho eloqüente da reencarnação, compelindo toda criatura humana a ser educada e a educar-se no curso da existência berço-túmulo.
No livro Vida e Sexo, cap. 21, Emmanuel nos fala dos problemas das minorias sexuais e a necessidade de respeito fraterno para com esses irmãos em prova. Acha você que, no futuro, as religiões irão compreender melhor a situação de resgate desses irmãos, amparando-os mais adequadamente?
Chico Xavier - Em matéria de relacionamento sexual, somente o tempo com a maturidade espiritual da maioria das criaturas encarnadas na Terra é que solucionará o problema de compreensão necessária ao equilíbrio e à segurança dos grupos sociais.
De todos os relacionamentos entre seres humanos, nenhum me parece mais conflitante que o relacionamento entre homem e mulher. Por que são tão raros os casais que vivem num clima de harmonia perfeita?
Chico Xavier - O relacionamento entre os parceiros da vida íntima no lar, na essência, é uma escola ativa de aperfeiçoamento do espírito. Até que duas criaturas alcancem o amor integral, uma pela outra, sob todos os aspectos da individualidade, é compreensível o atrito mais ou menos freqüente entre ambas, visando ao burilamento recíproco.
Quando um dos cônjuges não assume a responsabilidade na parte que lhe toca na sustentação do equilíbrio recíproco, qual a responsabilidade do outro que for buscar fora do lar vinculações extraconjugais?
Chico Xavier - Alguém que fira outro alguém, depois dos compromissos afetivos devidamente assumidos em dupla, é responsável pela lesão psicológica que cause, criando para outrem e para si mesmo dificuldades que só pelo amparo do tempo conseguirá resgatar.
Por que nunca há divórcio entre os espíritos sublimados no bem?
Emmanuel - Os espíritos sublimados nas leis do bem aprenderam a amar sem exigência e a aceitar as pessoas amadas como realmente são ou estão.
A ação negativa do cigarro sobre o perispírito do fumante prossegue após a morte do corpo físico? Até quando?
Emmanuel - O problema da dependência continua até que a impregnação dos agentes tóxicos nos tecidos sutis do corpo espiritual ceda lugar à normalidade do perispírito, o que, na maioria das vezes, tem a duração correspondente ao tempo em que o hábito perdurou na existência física do fumante. Quando a vontade do interessado não está suficientemente desenvolvida para arredar de si o costume inconveniente, o tratamento dele, no mundo espiritual, ainda exige cotas diárias de sucedâneos dos cigarros comuns, com ingredientes análogos aos dos cigarros terrestres, cuja administração ao paciente diminui gradativamente, até que ele consiga viver sem qualquer dependência do fumo.
Pesquisas médicas revelam que a dependência física dos fumantes costuma ser mais compulsiva que a dependência orgânica dos viciados em narcóticos. Isto é certo se o enfoque for do plano espiritual para o plano físico?
Emmanuel - Acreditamos que ambos os tipos de dependência se equiparam na feição compulsiva com que se apresenta, cabendo-nos uma observação: é que o fumo prejudica, de modo especial, apenas ao seu consumidor, enquanto os narcóticos de variada natureza são suscetíveis de induzir seus usuários a perigosas alucinações que, por vezes, lhes situam a mente em graves delitos, comprometendo a vida comunitária.
Você teria alcançado condições de desempenho de seu mandato mediúnico, ao longo de décadas de trabalho incessante, se fosse um dependente da nicotina?
Chico Xavier - Creio que não, com referência ao tempo de trabalho, de vez que a ingestão de nicotina agravaria as doenças de que sou portador, mas não quanto a supostas qualidades espirituais para o mandato referido, de vez que considero o "hábito de cultivar pensamentos infelizes" uma condição pior que o uso ou o abuso da nicotina e, sinceramente, do "hábito de cultivar pensamentos infelizes" ainda não me livrei.
Como explicar que as plantas manifestam sensações semelhantes às da pessoa que cuida delas e as ama - conforme se comprova por meio de polígrafos ligados à planta através de dois elétrodos -, mesmo que a pessoa esteja a quilômetros de distância?
Emmanuel - O fenômeno da empatia está presente em todos os seres e em todos os domínios do universo.
Você confirmaria que as plantas têm memória?
Emmanuel - As plantas possuem, compreensivelmente, a memória em construção, se nos é permitido assim nos exprimirmos. A memória, em qualquer grau, apresenta a parcela de discernimento que haja conquistado.
Para além das regras da fisiologia e da biologia de hoje, poderíamos dizer que além de mera sensitividade molecular há espiritualidade nas plantas?
Emmanuel - Em graus e tons diversos, a espiritualidade se encontra em qualquer partícula de vida.
Poderíamos então dizer que as plantas, percebendo o mundo que as rodeia, têm uma memória, uma linguagem própria e até mesmo alguns rudimentos de altruísmo?
Emmanuel - Sim, reconhecendo-se que a palavra "rudimentos" está positivamente adequada à indagação proposta.
O cientista Burban afirma que as plantas têm mais de 20 percepções diferentes das do homem. Como você classificaria tais percepções?
Emmanuel - As percepções das plantas estão no homem; contudo, as percepções humanas com a evolução da inteligência se fizeram altamente complexas, mas sempre enfeixando em si mesmo em caráter crítico - todas as percepções em vá-rias faixas da natureza, pelas quais o espírito humano já passou em sua multimilenária evolução sobre a Terra.
A respeito da auto-imunização contra os males e tentações da fama, Einstein fez o seguinte comentário: "A única forma de iludir a corrupção pessoal dos elogios é seguir trabalhando. A gente sente a tentação de deter-se para escutar os que nos elogiam. A única coisa a fazer é não prestar atenção e continuar trabalhando. Não há nada melhor que o trabalho." Qual sua fórmula ou meio de defesa ante as tentações da fama?
Chico Xavier - Não me considero com créditos para adquirir popularidade. Mas, devendo responder à pergunta, creio que a fama é uma grande oficina de fotografias. Uma criatura conquista renome e, com isso, passa a ser vista por numerosas pessoas que simpatizam ou não com ela. Começam aí as "fotos" da pessoa em causa. Cada amigo ou cada adversário apresenta a imagem que mentaliza e os retratos falados ou comentados vão aparecendo. Entretanto, no íntimo penso que uma criatura famosa se vê, na realidade, tal qual é, com muito mais necessidade de amparo, a fim de viver, do que de popularidade - embora, a meu ver, as pessoas famosas devam ser agradecidas a quantos lhes dispensam atenção.
Não conhecia a fórmula de Einstein para que alguém se imunize contra os riscos do elogio, mas nela encontro um modelo de equilíbrio e sensatez. Aliás, Emmanuel sempre me adverte que o trabalho é o caminho para a verdadeira paz, quando se encontra alicerçado no bem. Refiro-me ao assunto com o respeito que me vincula a indagação, mas preciso esclarecer que, quanto a mim, nunca precisei estar vigilante contra os inconvenientes da fama, de vez que nada fiz para conquistá-la, e se trabalho sempre é porque preciso aprender a servir, em meu próprio benefício, competindo-me ainda acrescentar que os espíritos amigos me ensinam que devo sempre trabalhar porque, sinceramente, não tenho algo de melhor para fazer.

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