Revista Espírita de 1866 (Parte 2)
MARCELO BORELA
DE OLIVEIRA
De Londrina
Damos continuidade à publicação
do texto condensado da Revista
Espírita
de 1866. As páginas citadas referem-
se à versão publicada pela Edicel.
26. Na seqüência, o editor do
semanário La Discussion, afirmou: “É assim que procederemos em relação ao
Espiritismo. Seja qual for a maneira de ver a seu respeito, ninguém pode dissimular
a extensão que tomou em poucos anos. Pelo número e pela qualidade de seus partidários,
conquistou uma posição entre as opiniões aceitas”.
Concluindo, depois de explicar que
as questões sobre Espiritismo seriam ali tratadas por espíritas, o editor aduziu:
“Em suma, La Discussion não se apresenta como órgão nem apóstolo do
Espiritismo; abre-lhe as suas colunas, como a todas as idéias novas, sem
pretender impor essa opinião aos seus leitores, sempre livres de a controlar, de
a aceitar ou de a rejeitar”. (Págs. 37 e 38.)
27. A Revista relata novo
caso de obsessão levado a bom termo em julho de 1865, na localidade de Cazères.
A obsedada tinha 22 anos e, embora gozasse
de saúde perfeita, fora de repente acometida de um acesso de loucura.
Como os médicos não haviam conseguido
curá-la, mesmo após sua internação num hospício de alienados mentais, os pais
recorreram ao Espiritismo.
Evocando o Espírito obsessor durante
oito dias seguidos, o grupo espírita conseguiu mudar suas más disposições e,
feito isto, a doente ficou curada. (Págs. 38 e 39.)
28. Analisando o fato, Kardec diz que
o episódio constituía uma nova prova da existência da loucura obsessional,
cuja causa difere da loucura patológica e ante a qual a ciência falhará sempre
enquanto se obstinar em negar o elemento espiritual e sua influência sobre o
homem. (Pág. 39.)
29. Em seguida, Kardec refere um fato
semelhante relatado pelo grupo espírita de Marmande, que também obteve êxito ao
tratar um camponês que, atingido por uma loucura furiosa, perseguia as pessoas
a golpes de forcado, para as matar. Ele era, no entanto, apenas uma vítima de
uma obsessão grave e em oito dias, sem nenhum tratamento físico, voltou ao
estado normal, graças à terapia espírita (Págs. 39 e 40.)
30. Os casos de obsessão eram tão freqüentes
que não seria exagero dizer que nos hospitais de alienados mais da metade têm
apenas a aparência da loucura, mas não são loucos.
Essa observação é de Kardec, que
adverte obsessores desencarnados. “O único meio de os dominar é o ascendente
moral”, com cuja ajuda, pelo raciocínio e com sábios conselhos, é possível torná-los
melhores. Esse é o segredo da cura: conversa-se com o Espírito, buscando moralizá-lo
e educá-lo, como faríamos se ele estivesse encarnado, e dirigindo com tato as
instruções que lhe são dadas. (Págs. 40 a 42.)
Kardec explica por que
existem antropófagos no mundo
31. Não nos devemos admirar mais
das obsessões do que das enfermidades e outros males que afligem a humanidade,
porque elas fazem parte das provas e das misérias devidas à inferioridade do
meio em que vivemos.
Os homens sofrem então neste mundo
as conseqüências de suas imperfeições, porque, se fossem mais perfeitos, aqui
não estariam. (Pág. 42.)
32. O depoimento de um passageiro que
escapou com vida ao naufrágio do Borysthène, ocorrido nas costas da Argélia
a 15 de dezembro de 1865, é transcrito pela Revista e comentado por
Kardec, que explica por que, em casos assim, há pessoas que se desesperam e se
matam, sem esperar o desfecho do desastre. (Págs. 42 a 44.)
33. Duas comunicações sobre o assunto
foram, então, recebidas na Sociedade Espírita de Paris no dia 12 de janeiro.
Eis, de forma resumida, o que elas revelaram: I – A prece é o veículo dos
fluidos espirituais mais poderosos e são como um bálsamo salutar para as feridas
da alma e do corpo. Atrai todos os seres para Deus e faz a alma sair da espécie
de letargia em que se acha mergulhada, quando esquece seus deveres para com o
Criador. II – Dita com fé, provoca nos que a ouvem o desejo de imitar os que
oram, porque o exemplo e a palavra também levam fluidos magnéticos de grande
força. III – Quanto ao homem que quis suicidar-se em face da morte certa, a
idéia lhe veio de uma instintiva repulsa pela água, visto que era a terceira
vez que morreria dessa maneira. IV – Devemos orar pelos infelizes, porque a prece
de várias pessoas forma um feixe que sustenta e fortifica a alma pela qual é
feita, dando-lhe força e resignação. V – Aos que julgam não ter necessidade de
Deus, o Pai permite sejam expostos a um fim terrível, sem esperança de qualquer
ajuda. Então eles se lembram de que outrora rezaram e que a prece dissipa as
tristezas, faz suportar os sofrimentos com coragem e suaviza os últimos momentos
do agonizante. VI – É que a prece é uma necessidade da alma e tem para todos
uma imensa utilidade. (Págs. 44 a 46.)
34. Segundo o Siècle de
dezembro de 1865, o almirantado inglês advertiu os capitães de navios mercantes
que se dirigiam à Oceania para tomarem todas as precauções com vistas a evitar que
sua tripulação fosse vítima dos antropófagos das Novas-Hébridas, da baía de
Jervis ou da Nova-Caledônia, onde recrudescera a prática da antropofagia. (Págs.
46 a 49.)
35. Comentando a notícia, Kardec explica
por que existem no mundo antropófagos, que são pessoas como nós mesmos. As
almas dos que mantêm esse hábito – diz Kardec – estão ainda próximas de sua
origem e suas faculdades intelectuais e morais são pouco desenvolvidas; mas
elas progredirão também, graças às vidas sucessivas. (Págs. 48 e 49.)
Duas causas explicam a
impotência dos exorcismos
36. O fato de haver aumentado naquela
região do planeta a prática da antropofagia explica-se pela circunstância de
ter, provavelmente, ocorrido ali uma chegada em massa de almas bastante
atrasadas, com vistas ao seu adiantamento, porque só reencarnando é que elas
poderão libertar-se desses e de outros hábitos cuja erradicação é sinal
inconteste de progresso. (Pág. 49.)
37. A Revista informa que,
desde a interessante história que envolveu o sr. Bach e a espineta de Henrique
III, o citado músico tornou-se médium escrevente.
Outro curioso episódio relacionado com
aquele instrumento musical é relatado, então, por Kardec, no número de
fevereiro de 1866. (Págs. 49 a 55.)
38. O próprio Henrique III,
presente à sessão realizada em janeiro na Sociedade Espírita de Paris, de que participava
também o sr. Bach, confirmou ser o autor do pergaminho que o músico encontrara
na espineta, à esquerda do teclado, entre duas tabuinhas. A caligrafia,
comparada com a utilizada em outros manuscritos encontrados na Biblioteca
Imperial, correspondia realmente à do monarca. (Págs. 51 a 55.)
39. Novos episódios de pancadas e
outras manifestações físicas espontâneas agitaram a casa de um fazendeiro muito
rico, em Équihen, perto de Boulogne. Chamados a intervir, quatro curas,
seguidos depois de cinco redentoristas e três ou quatro religiosas foram até a
casa e praticaram o exorcismo, sem nenhum resultado.
Como a família desconfiasse de que os
fenômenos poderiam estar sendo causados por um irmão do fazendeiro, morto dois
anos antes na Argélia, os clérigos aconselharam-no a partir para a Argélia à
busca do corpo do irmão, cumprindo o que lhe havia sido prometido. (Págs. 56
e 57.)
40. Kardec aproveita a oportunidade
para mostrar a incoerência dos exorcistas no caso. Ora, se eles entendiam que
na alma do falecido poderia estar a causa dos fenômenos, por que o exorcismo? É
preciso ser coerente.
Duas causas – lembra Kardec –
explicam a impotência dos exorcismos:
1ª – Eles são dirigidos aos
demônios; contudo os obsessores e perturbadores não são demônios, mas seres
humanos.
2a – O exorcismo não é uma prece,
mas um anátema, uma ameaça, que irrita o agente invisível e não concorre para o
conduzir ao bem. (Pág. 57.)
41. Os adversários do Espiritismo não
perderam tempo e exploraram ao máximo as peloticas dos irmãos Davenport, os
dois jovens americanos que foram pegos fraudando em Paris.
Os críticos imaginavam, talvez, que
Kardec fosse defender os irmãos, mas se enganaram inteiramente porque o Codificador
deixou claro que as exibições teatrais e
a exploração da mediunidade nada têm a ver com o verdadeiro espírito da
doutrina. “Que a crítica bata quanto queira nestes abusos; desmascare os
truques e os cordões dos charlatães, e o Espiritismo, que não usa qualquer
processo secreto e cuja doutrina é toda moral, não poderá senão ganhar em ser
desembaraçado dos parasitas que dele fazem um degrau e dos que lhe desnaturam o
caráter.” (Págs. 59 a 61.)
Os fluidos espirituais
segundo a Doutrina Espírita
42. Notícia publicada na França diz
que os irmãos Davenport, de volta a Nova York, foram publicamente desmentidos
por um antigo comparsa, o sr. Fay, na presença de numerosa assistência. O sr.
Fay teria desvendado tudo, todas as charlatanices, o segredo das cordas e o dos
nós, que haviam tornado famosos os irmãos.
Kardec, embora reiterando sua
condenação às exibições dos Davenport, contestou a notícia, informando que ambos
ainda se encontravam na Inglaterra.
William Fay, o cunhado dos Davenport,
que os acompanhava, era outra pessoa. O autor dos fatos divulgados pelos
jornais era um tal H.
Melleville Fay, seu concorrente e
não amigo. (Págs. 61 a 63.)
43. A crítica – observa Kardec – desceu
o braço sobre os Davenport, julgando que assim estaria matando o Espiritismo.
Ora, o que ela matou foi precisamente o que o Espiritismo condena e desaprova:
a exploração, as exibições públicas, o charlatanismo, as manobras fraudulentas,
as imitações grosseiras de fenômenos naturais, o abuso de um nome que
representa uma doutrina toda moral, de amor e de caridade. (Pág. 64.)
44. Um longo estudo sobre os
fluidos espirituais abre a Revista de março de 1866. Eis, de forma
resumida, os ensinamentos que nele se contêm:
I – Os fluidos espirituais representam um importante
papel em todos os fenômenos espíritas, ou melhor, são o princípio mesmo desses
fenômenos.
II – Não existe uma única ciência
que seja, em todas as suas peças, obra de um só homem.
Assim se dá com a ciência espírita,
que requer para se constituir o esforço dos Espíritos e dos encarnados.
III – Os corpos formam na obra da
criação uma cadeia ininterrupta, de tal sorte que os três reinos não subsistem,
na realidade, senão por seus caracteres gerais mais marcantes, visto que nos
seus limites eles se confundem.
IV – O homem pode operar artificialmente as composições
e decomposições que se operam espontaneamente na natureza, mas é impotente para
reconstituir o menor corpo organizado, ainda que seja uma folha morta.
V – Ele não pode reconstituí-la,
nem lhe dar vida, o que mostra que seu poder pára na matéria inerte e que o
princípio da vida está na mão de Deus.
VI – A ciência caminha para a
admissão de que os corpos chamados simples não passam de modificações de um
elemento único, princípio universal, designado sob os nomes de éter, fluido
cósmico ou fluido universal.
VII – A química faz-nos penetrar na
constituição íntima dos corpos, mas, experimentalmente, não vai além dos corpos
considerados simples. Ora, entre esse elemento em sua pureza absoluta e o ponto
onde param as investigações da ciência, o intervalo é imenso.
VIII – Raciocinando-se por
analogia, chega-se à conclusão de que, entre esses dois pontos extremos, esse
elemento primordial deve sofrer modificações que escapam aos instrumentos e
sentidos materiais.
IX – A natureza íntima da alma
escapa completamente às investigações humanas, mas sabemos que ela é revestida
de um envoltório ou corpo fluídico, constituindo, assim, com esse envoltório o
ser que chamamos Espírito.
X – Esse envoltório, que chamamos
de perispírito, posto que de uma natureza etérea e sutil, não é menos matéria,
e reveste a alma, não só durante a encarnação, mas também na erraticidade.
XI – Sendo o laço que une a alma ao
corpo material, o perispírito não é uma criação imaginária, e sua existência é
um fato comprovado pela observação.
XII – Todas as teogonias atribuem
aos seres invisíveis um corpo fluídico e São Paulo o define claramente em sua 1a
Epístola aos Coríntios (XV:35-50). (Págs. 67 a 74.)
(Continua no próximo número.)
O
IMORTAL
JORNAL DE DIVULGAÇÃO ESPÍRITA
Diretor Responsável: Hugo
Gonçalves Ano 53 Nº 624 Fevereiro de 2006
RUA PARÁ, 292,
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