Clara Lila Gonzales de Araújo
“(...) para o que não crê na eternidade e julga que com a vida tudo se
acaba, se os infortúnios e as aflições o acabrunham, unicamente na morte vê uma
solução para as suas amarguras. Nada esperando, acha muito natural, muito
lógico mesmo, abreviar pelo suicídio as suas misérias.” (O suicídio e a
loucura”. In: O Evangelho segundo o Espiritismo.)
Crianças e adolescentes, em número expressivo,
buscam no suicídio a fuga que lhes parece mais viável aos dissabores e
dificuldades que surgem de suas experiências na matéria.
O assunto, de importância vital para análise e
reflexão de todos os espíritas, é destacado no temário das Campanhas VIVER EM FAMÍLIA e EM DEFESA DA
VIDA , reativadas pelo Conselho
Federativo Nacional, órgão da Federação Espírita Brasileira, em 21 de novembro
de 2004, tendo como uma de suas ações, em nível nacional, estimular o
aprofundamento de temas dessa natureza, concluindo quão importante tornar-se o
conviver em família, onde sob todos os aspectos, a vida deve ser preservada e
cuidar.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde
(2000), no mundo inteiro, o suicídio está entre as cinco maiores causas de
morte na faixa etária de 15 a
19 anos e em vários países ele fica como primeira ou segunda causa de morte
entre meninos e meninas nessa mesma faixa etária. Verificamos que,
estaticamente, o Brasil se coloca como um dos países que possui um índice
relativamente significativo neste tipo de morte entre os jovens: nos anos de 1991 a 2000, os suicídios,
nessa faixa etária, tiveram crescimento de 28,5% e os dados, atualmente,
apresentam, segundo a magnitude da população jovem brasileira, uma taxa de 4,0
suicídios por 100 mil habitantes.
É possível, também, observar que a incidência dos
óbitos por suicídio apresenta, a partir dos 10 anos, uma forte tendência
ascendente para chegar à sua máxima expressão aos 21 anos de idade.
É entristecedor ver esses Espíritos envolvidos em
tantas frustrações, decorrentes de conflitos íntimos e de uma educação mal
administrada, por parte dos pais, ou por serem, alguns portadores de
desequilíbrios emocionais que não foram atendidos adequadamente na infância,
levando-os a uma atitude tão drástica.
O espírito Manoel Philomeno de Miranda (1991)
aponta para os graves agentes psicológicos que levam ao suicídio, como a
angústia, a insegurança, os conturbadores fenômenos psicossociais e econômicos,
as enfermidades crucificadoras, o sentimento de desamparo e de perda, todos com
sede na alma imatura e ingrata, fraca de recursos morais para sobrepô-los às contingências
transitórias desses propelentes ao ato extremo. E, este trágico ato assume gravidade
e constrangimento maiores, quando crianças, que ainda não dispõem do
discernimento, optam pela aberrante decisão.
Como avaliar o tresloucado gesto de seres tão
jovens, sob a visão espírita?
Que causas estimulam esses Espíritos, ainda
imaturos, a buscarem, no gesto derradeiro, a superação dos problemas que os
alucinam?
Mesmo considerando o grande número de suicidas que
renascem com as impressões da ação cometidas em vidas passadas, é necessária
uma análise mais acurada sobre as razões que os impelem a cometer novas transgressões
às leis de Deus, agravando ainda mais sua situação espiritual.
Analisaremos, inicialmente, os suicídios que têm
por causa a obsessão.
Elucida-nos o venerável Espírito Bezerra de Menezes
que Espíritos perversos influenciam os encarnados, sugestionando-os a
cometerem o ato terrível, através do sono de cada noite, por uma pressão obsessora
do seu desafeto espiritual, (...). Outros existem que não querem absolutamente
morrer, não desejam o suicídio (...) Apesar disso, sucumbem, (...) uma vez que,
deseducados da luz das verdades eternas, desconhecedores do verdadeiro móvel da
vida humana, como da natureza espiritual do homem, não lograram forças nem
elementos com que se libertassem do julgo mental (...) cujo acesso permitiram.
Esses suicídios, levados a efeito por influências obsessivas, apresentam certa parcela
de atenuantes para as vítimas e graves responsabilidades para os que os
motivaram, respondendo, esses algozes, perante a Justiça Divina, pela crueldade
cometida contra os seus adversários.
Intriga-nos, sem dúvida, que esta situação possa
ocorrer com crianças e jovens.
A análise feita por Allan Kardec à resposta dada
pelos Espíritos Superiores, à questão 199a, em O LIVRO DOS ESPÍRITOS, esclarece-nos sobre o problema.
Diz o Codificador: Aliás, não é racional
considerar-se a infância como um estado normal de inocência.
Não se vêem crianças dotadas dos piores instintos, numa idade em que
ainda nenhuma influência pode ter tido a educação? Algumas não há que parecem
trazer do berço a astúcia, a felonia, a perfídia, até o pendor para o roubo e
para o assassínio, não obstante os bons exemplos que de todos os lados se lhes
dão?
Conclui Kardec, na mesma nota, que esses Espíritos
se revelam viciosos por não possuírem progresso, sofrendo, então, por efeito de
sua inferioridade.
Essas crianças, geralmente, manifestam comportamentos
desequilibrados, como resultante da rebeldia, da insatisfação, do nervosismo,
da dificuldade intelectual que apresentam, agravando-se, cada vez mais, a sua existência,
caso não recebam os cuidados urgentes dos pais, em forma de afeto, compreensão
e providências terapêuticas adequadas, para que consigam superar reminiscências
tão dolorosas.
Suely Caldas Schubert (1981), ao referir-se ao
problema da obsessão na infância, traz de sua experiência interessantes
depoimentos sobre crianças que tentaram o suicídio. Um desses casos foi
destacado como gravíssimo.
Conta-nos a autora que certa criança de três anos e
alguns meses vinha tentando o suicídio das mais diferentes maneiras, o que lhe
resultara, inclusive, ferimentos: um dia, jogou-se na piscina; em outro atirou-se
do alto do telhado, na varanda de sua casa; depois quis atirar-se do carro em movimento,
o que levou os familiares a vigiá-la dia e noite. Seu comportamento, de súbito,
tornou-se estranho, maltratando especialmente a mãe, a quem dirigia palavras de
baixo calão que os pais nunca imaginaram ser do seu conhecimento.
Os pais da referida criança buscaram ajuda no
Espiritismo e, a partir das reuniões de desobsessão, realizadas em seu
benefício, foi possível diagnosticar, espiritualmente, as causas do seu estado
atual. A oração, o passe e a água fluidificada, usados na terapêutica espiritual,
melhoraram sensivelmente o problema obsessivo e outras crianças, que
apresentavam sintomas semelhantes, foram amparadas, igualmente. Schubert chama atenção
para a importância das aulas de Evangelização Espírita, quando os pequeninos
seres são extremamente ajudados pelos ensinamentos ministrados, oferecidos por
meio das luzes do esclarecimento espírita-cristão de que tanto carecem.
Além das orientações que recebemos da profilaxia
espírita é imprescindível procurarmos o auxílio de psicólogos, médicos,
educadores e outros, que orientem na utilização de mecanismos preventivos, para
o reajustamento dessas crianças.
É importante ressaltar, todavia, que ao tratarmos
de suicídio, não podemos apenas nos referir às obsessões, que influenciam
grandemente essas almas torturadas, mas devemos levar em conta o rol de
dificuldades que esses Espíritos trazem consigo, impulsionando os a cometer
desatinos de toda sorte, em prejuízo próprio, não lhes permitindo viver de
forma mais tranqüila e segura.
Aos pais cabe a tarefa maior de ampará-los,
dispensando-lhes muito amor, a fim de que se sintam amados e possam superar
esses estados de sofrimento, choques e dores que necessitam ser atenuados por meio
da educação, na prática de exercícios moralizadores, até que consigam transformar
suas disposições mentais, na busca do rumo feliz que tanto anelam.
Ao conhecermos os fatores causais dos sofrimentos
que nos atingem, passamos a aceitar com resignação e responsabilidade as provas
indispensáveis para evoluirmos. Por isso, aceitar filhos difíceis é reagir de
forma positiva, envolvendo-os em vibrações de ternura, anulando-lhes as
impressões negativas, dialogando constantemente com eles, no uso da palavra envolta
em emoção afetuosa e franca, e transmitindo-lhes a confiança de que haverão de
se livrar dos problemas íntimos que os oprimem, confiando em Jesus e nos
benfeitores espirituais. A criança, se evangelizada desde cedo, tem noção exata
do que significa o amparo desses Amigos do além-túmulo.
O problema do suicídio assume dimensões maiores na
adolescência, quando, quase sempre, não se recebeu ajuda na fase infantil.
O Espírito Joanna de Ângelis (1998) afirma que a
desinformação a respeito da imortalidade do Ser e da reencarnação responde pela
correria alucinada na busca do suicídio(...) E essa falta de esclarecimento é
maior no período infanto-juvenil,(...) facultando a fuga hedionda da existência
carnal (...)
Há que se considerar, também, o suicídio indireto,
quando o adolescente, vivendo em clima de lutas acerbas e não tendo recebido
uma base familiar de orientação segura, desgasta suas forças morais e
emocionais, enredando-se no jogo das paixões, principalmente no sexo em uso
excessivo, na ingestão de bebidas alcoólicas, do fumo nocivo e das drogas,
resultando nas relações comportamentais rebeldes e agressivas, que causarão
sobrecargas destrutivas no conjunto do Ser, desequilibrando suas condições
física e mental.
O panorama traçado até aqui mostra que o suicídio
de crianças e jovens é constantemente desafiado pelas circunstâncias, muitas
vezes imprevisíveis, que surgem dentro do próprio lar.
O lar deve ser escola de real educação, sem o
caráter autoritário e impositivo, que torne as relações entre pais e filhos
obsessivas e desgastantes, mas com a preocupação sincera de estabelecer-se
entre eles uma amizade verdadeira, que lhes permita encontrar a resistência
espiritual de que precisam, para enfrentar as vicissitudes e os desafios
decorrentes de frustrações e de conflitos íntimos, surgidos, especialmente dos
relacionamentos inter-pessoais, nem sempre vividos favoravelmente A educação
que se funda no processo de despertar os poderes latentes do Espírito é a única
que realmente resolve o problema do ser.
Educação que deve preparar o indivíduo para a vida
como realmente ela é, destacando, sempre, a bênção da reencarnação, que permite
lutar pelas mais nobres aspirações e reconhecendo, com gratidão, os destinos altaneiros
que Deus concebeu e tracejou para o Espírito.
Importa, pois, primeiramente, que a criança e o
adolescente tenham uma visão correta sobre a realidade e o futuro do Ser,
traçando para si valores éticos e cristãos que constituem a verdadeira vida e
que os fará esperar pela concretização de realizações que os estimulem ao
progresso.
A missão do Espiritismo é educar para salvar. Tenhamos
nós, espíritas, a certeza desta revelação, pois enquanto esse fato não penetrar
em nossas mentes e corações não saberemos acolher, com compreensão, essas almas
infelizes e enfermas, necessitadas de infinito amor. Quanto a isso, reflitamos
sobre a sábia lição de Jesus: Ninguém acende uma
candeia para pô-la debaixo do alqueire; põe-na, ao contrário, sobre o
candeeiro, a fim de que ilumine a todos os que estão na casa. (Mateus,
5:15)
Fonte: REFORMADOR, nº 2117
“INFORMAÇÃO”:
REVISTA
ESPÍRITA MENSAL
ANO XXX Nº 352
Fevereiro 2006
Publicada pelo
Grupo Espírita “Casa do Caminho” -
Redação:
Rua Souza Caldas,
343 - Fone: (11) 2764-5700
Correspondência:
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