O QUE É CIÊNCIA
CONCEITO
Há um grande desconhecimento, mesmo no seio da
comunidade cientifica, do que seja realmente Ciência. O conceito de ciência foi
sendo refinado ao longo do tempo a partir do século XVII, quando começou a
surgir o que hoje se entende por ciência, e a grande maioria dos membros da
comunidade cientifica ainda se encontra apegado a conceitos inteiramente
ultrapassados pelas modernas pesquisas da Historia da Ciência e da Filosofia da
Ciência.
A PALAVRA CIÊNCIA E SEUS SIGNIFICADOS
Passemos agora a um outro tópico: os significados da
palavra "Ciência". Vários são os sentidos que esta palavra pode ter,
obviamente relacionados entre si. "Ciência" significa conhecimento,
sendo usada com significado geral ("o fruto da árvore da ciência do bem e
do mal") ou restrito ("a ciência de fazer papagaios de papel").
Significa um determinado tipo de conhecimento já consagrado como tal, como a
Física, a Química, a Biologia, etc. Significa a atividade através da qual se obtém
este conhecimento ("fazer ciência" = realizar uma determinada
atividade científica). Significa também o conjunto de pessoas empenhadas na
atividade científica: "a comunidade científica". Quando se diz que a
"ciência aceita a tese de que há outros mundos também habitados",
está se querendo dizer que a comunidade dos cientistas (ou parte dela) aceita
esta tese, pois obviamente não há ainda um estudo científico, no sentido
convencional do termo, sobre outros mundos habitados.
Nem sempre porém a comunidade científica é homogênea e
coesa. os cientistas são pessoas que em suas atividades profissionais buscam
objetividade, precisão, rigor lógico, etc., porém fora dessas atividades são
pessoas comuns, com todas idiossincrasias, perempções e preconceitos do vulgo.
Kardec já comenta isto na Introdução de O Livro dos Espíritos e em O que é o
Espiritismo. Bertrand Russell, conhecido filósofo do século XX, menciona em um
de seus textos (A perceptiva Científica, trad. J. B. Ramos, Cia. Ed. Nacional.
1956):
“Se algum de vossos
amigos for um cientista, acostumado a maior precisão quantitativa em suas
experiências, e que possua a mais recôndita capacidade de inferir, podereis
sujeitá-lo a pequena experiência sem dúvida significativa. Caso escolherdes em
palestra como assunto política, teologia, impostos sobre a renda, corretagem, a
vaidade das classes trabalhadoras e outros tópicos de natureza semelhante,
provocareis sem dúvida uma explosão e ireis escutá-lo expressar opiniões que
não forram verificadas, com um dogmatismo que nunca poderia expressar com
relação a resultados que fossem fundados em suas pesquisas de laboratório.”
CIÊNCIA E MÉTODO CIENTÍFICO
Talvez a maneira mais sucinta de caracterizar o
conhecimento científico é descrever como ele estuda e não o que ele estuda. A
ciência poderia em principio estudar qualquer coisa: A estrutura do átomo, a
origem do universo, a existência do mundo espiritual, o processo pelo qual 1
aprendemos uma língua, etc. Em tese todas as
“ciências” , as naturais ou sociais, deveriam usar o mesmo método, embora
possam lançar mão de técnicas diferentes.
Um método pode ser definido como uma série de regras
para tentar resolver um problema.
No caso do método científico, estas regras são bem
gerais. Há um método para testar criticamente e selecionar as melhores
hipóteses e é nesse sentido que podemos questionar se há um método científico.
O Mito da Observação
Pura – O EMPIRISMO
Segundo essa corrente filosófica, representada por
Francis Bacon (1561), Jonh Lock (1632) e David Hume (1711), nascemos com um
cérebro “vazio”, que recolhe passivamente as informações recebidas pelos órgãos
dos sentidos, isto é, todo conhecimento provém das experiências sensoriais.
Outros conhecimentos podem ser elaborados internamente através de associações,
porém esse novo conhecimento seria menos seguro, pois não provém da experiência
diretamente.
Posteriormente, o filosofo Bertrand Russel (1872-1970)
sugeriu que a partir de nossas sensações ou experiências mais elementares-
poderíamos com o auxilio da lógica, construir o conhecimento cientifico. A
partir dessa idéia surgiu o movimento conhecido como positivismo lógico. Seguiram assim com o pensamento
indutivista de David Hume. Segundo essa linha de pensamento, a aquisição do
conhecimento deve sempre partir de experimentos empíricos, e a
partir da tabulação dos resultados é que deve ser
elaboradas as teorias cientificas. Declara também que as sentenças que não
puderem ser verificadas empiricamente estão fora da fronteira do conhecimento,
e devem ser discutidas pela ciência, questões metafísicas como a existência de
Deus, a natureza dos conceitos universais (tempo, espaço, etc) e a essência das
coisas, etc.
A primeira critica as idéias acima foi estabelecida
por Imanuel Kant (1724-1804). Para ele os conceitos de tempo e espaço não
dependiam da experiência pessoal (conhecimento a priori) e o conhecimento
sintético (como a geometria euclidiana) eram os únicos conhecimentos seguros.
Todos os demais conhecimentos poderiam ser falhos por
depender da percepcao- pessoal sobre fenômenos externos. Atualmente os
principais filósofos não concordam com Kant no que diz respeito ao seu método -
O argumento transcendental, extremamente complexo e subjetivo.
O FALSEONISMO
Mais recentemente o filosofo alemão Karl Popper, diz
concordar com as criticas a Hume (indutivismo) de que por maior que seja o
numero de repetições de certos eventos, não temos justificativa para acreditar
que eles ocorrerão no futuro. Popper afirma que já que não se pode confirmar
uma hipótese ou uma lei geral, poderíamos tentar refutá-la pela experiência e
repetição. O critério da refutabilidade (falseonismo) torna possível através de
argumentos lógicos a nossa preferência por uma teoria em vez de outra. A partir
dai a comunidade acadêmica considera que somente as teorias que de alguma forma
possa ser testada objetivamente, como sendo uma teoria genuinamente cientifica.
Áreas do conhecimento como astrologia, parapsicologia, marxismo, espiritismo,
por exemplo são consideradas quando muito como pseudo-ciências.
Modernamente surgiram criticas ao falseonismo, os
principais filósofos que se destacaram foram Tomhas Kuhn (1922) e Inre Lakatos.
OS PARADIGMAS – Ciência Normal x Ciência
Extraordinária
Nas idéias de Kuhn o conceito de “paradigma” é
fundamental. Paradigmas são realizações científicas que servem de modelo para
toda a pesquisa, determinando que tipos de leis e teorias são válidos, que
tipos de dados são pertinentes, que problemas serão investigados, que tipo de
soluções serão propostas e até mesmo como os fenômenos podem ser percebidos. De
certa forma o paradigma, em uma certa época funciona como uma “visão de mundo“,
influenciando e de certa forma controlando toda a pesquisa científica. A
“ciência” que se faz dentro desses limites é chamada de ciência normal.
Quando muitas anomalias se acumulam sem ser explicadas
pelas teorias do Paradigma atual, este começa a ser questionado, surgindo então
uma nova forma de fazer ciência, diferente da ciência normal: A ciência
extraordinária ou revolucionária. Quando um novo paradigma é finalmente aceito,
a ciência passa para um período normal: Livros são reescritos, currículos são
reformulados, etc..
LAKATOS E OS PROGRAMAS DE PESQUISA CIENTÍFICA
Contrariando Popper, Lakatos defendeu a idéia de que
“são exatamente as teorias científicas mais admiradas que simplesmente falham
em proibir qualquer estado observável de coisas”, ou seja, as teorias
científicas seriam irrefutáveis. Portanto o critério de refutabilidade seria no
mínimo insuficiente para determinar a cientificidade de uma teoria.
Lakatos afirma que um programa de pesquisa científica
deve ter um núcleo principal rígido com os princípios da teoria, e um cinturão
de hipóteses protetoras que podem sofrer adaptações/ no decorrer do
desenvolvimento da ciência. Esse conjunto de preposições devem ser coerentes
entre si e devem poder prever fatos novos, além de apresentar desenvolvimentos
significativos
no programa de pesquisa e em suas teorias.
O núcleo rígido (hard core) de um programa e aquilo
que essencialmente o identifica e caracteriza, constituindo-se de uma ou mais
hipóteses teóricas. Eis alguns exemplos. O núcleo rígido da cosmologia
aristotélica inclui, entre outras, as hipóteses da finitude e esfericidade do
Universo, a impossibilidade do vazio, os movimentos naturais, a
incorruptibilidade dos céus.
O núcleo da astronomia copernicaniana consiste das
assunções de que a Terra gira sobre si mesma em um dia e em torno do Sol em um
ano, e de que os demais planetas também orbitam o Sol. O da mecânica newtoniana
é formado das três leis dinâmicas e da lei da gravitação universal. O da teoria
especial da relatividade, o principio da relatividade e a constância da
velocidade da luz; o da teoria da evolução de Darwin-Wallace, o mecanismo da
seleção natural.
Por "uma decisão metodológica de seus
protagonistas" (Lakatos 1970, p. 133), o núcleo rígido de um programa de
pesquisa é "decretado" não-refutável. Possíveis discrepancias com os
resultados empíricos são eliminadas pela modificação das hipóteses do cinturão
protetor.
Como podemos notar da citação acima, os modernos
conceitos de ciência, mais realistas, deixam transparecer o caráter claramente
humano da ciência, que passa a ser então vista como um fruto das convicções de
um grupo social (que "decreta" que o núcleo rígido de seu programa de
pesquisa é não-refutável), com todo o seu conteúdo de crenças e descrenças e, portanto, de subjetivismo.
Enfim, assume-se claramente a realidade de que não existe um método 100%
"objetivo e seguro" de se fazer ciência.
O MÉTODO CIENTÍFICO
A FILOSOFIA DO MÉTODO
O homem é um animal curioso e inteligente, sente a
necessidade de resolver problemas e explicar fenômenos. Tem sede de saber e
compreender a si próprio. A ciência é uma forma de conhecer o mundo, de tentar
conhecer mais, de desvendar os mistérios da natureza. Não é o único caminho
para tentar captar a realidade e se por um lado, podemos estabelecer alguns
critérios práticos utilizado em nosso dia–a-dia o chamado senso comum por um
outro lado, há também muito em comum entre essa diversas formas de tentar
compreender o mundo.
O que melhor caracteriza o conhecimento científico não
é o que ele estuda, mas como estuda. A ciência pode ou poderia estudar desde a
estrutura do átomo até o processo de aprendizado de uma língua. Portanto não é
o objeto de estudo que é importante, mas a forma. O método pelo qual estudo
este objeto.
Podemos discutir se há unidade de métodos nas diversas
ciências; matemática e lógica, possuem certas características próprias
diferentes das demais ciências. Também é discutível, se as ciências humanas
sociais como sociologia a psicologia, valem-se do mesmo método, embora possa
lançar mão de técnica diferente.
CARACTERÍSTICAS
É oportuno apresentar aqui as características do
método científico, que também se aplica ao mesmo tempo ao método, filosófico
com pequenas restrições, por se tratar de objeto não material. São as seguintes
características básicas da ciências e do método científico, tomando como
referência principalmente as idéias de Karl
Popper e o seu Falseonismo, do qual faremos uma revisão
no próximo roteiro:
a) O conhecimento cientifico é conjectural: não há veredas
inquestionáveis – qualquer teoria pode vir a ser refutada e substituída por
outra melhor.
b) A atividade científica começa a partir de um
problema , e não de observações puras ou coletas de dados. O problema, por sua
vez, nasce de lacunas ou falhas em uma teoria prévia (ou expectativas ,
hipóteses ,etc.).
c) Para resolvermos um problema formulamos
hipóteses .As hipóteses e teorias guiam nossas observações e nossos testes, ou
seja, nossas tentativas de refutá-las.
d) Se a hipótese, lei ou teoria resistir ao
teste, ela será aceita, provisoriamente, como possivelmente verdadeira – mas
jamais poderá ser definitivamente comprovada, nem sua probabilidade aumentará
com a repetição do experimento.
e) Uma hipótese será considerada científica se
for possível imaginar uma situação que a
refute, uma vez que as hipóteses e as teorias
científicas –embora não sejam
logicamente refutáveis. Entretanto a decisão de
aceitar ou não uma refutação é
sempre conjetural.
f) O aprendizado científico ocorre por ensaio e
erro e não por indução: testamos e criticamos nossas hipóteses, substituindo-as
por outras melhores em caso de refutação. A nova hipótese gera novos problemas
e, dessa forma, o conhecimento científico progride.
g) Nas explicações científicas, utilizamos, além
das condições iniciais, leis gerais que afirmam em que condições os fenômenos
devem ocorrer e que podem ter tanto um caráter causal como um caráter
probabilístico.
h) As teorias se valem de modelos e procuram
refletir, de forma parcial, simplificada e hipotética, aquilo que ocorre na
natureza. Uma teoria deve ser logicamente coerente e compatível com outras
teorias científicas.
i) Quanto mais geral, profunda, simples e
preciso for uma hipótese, lei ou teoria, mais acontecimentos ela proíbe, maior
seu conteúdo empírico, sua testabilidade, sua refutabilidade é menor que sua
probabilidade inicial. Logo, maior a chance de nosso conhecimento avançar. Por
isso, não devemos fugir á refutação através de hipóteses ad hoc que diminuam o
conteúdo empírico e a refutabilidade de uma hipótese ou teoria.
j) Quanto mas rigoroso for um teste, maior a
chance de refutarmos uma hipótese. Por isso, devemos nos valer de experiências
controladas e de medidas. Além disso,as experiências controladas – juntamente
com a possibilidade de repetição do experimento por outro pesquisador –
contribuem para a objetividade científica.
k) Hipóteses ou leis probabilísticas podem ser
testadas se admitirmos que elas excluem eventos altamente improváveis. Se um
evento desse tipo ocorrer , consideraremos a hipótese ou lei em questão,
refutada.
l) Correlações estatísticas não indicam
necessariamente causas. Somente uma teoria representacional, valendo-se de
conceitos não observáveis, pode fornecer um apoio mais profundo para leis
fenomenológicas e generalizações empíricas.
m) Se uma teoria entrar em conflito com os
resultados de um teste , o ”culpado” pela contradição pode se encontrar tanto
entre os princípios fundamentais da teoria, como entre as hipóteses adicionais
ou entre as teorias auxiliares , utilizados para estabelecer as condições
iniciais e construir o experimento . Para encontrá-los teremos de nos valer de
teste independentes e, se não for possível descobrir o culpado através deles,
teremos de esperar que uma nova teoria explique
os resultados obtidos.
n) Quando mais impossível – á luz das teorias
aceitas – for uma previsão, mais
severamente ela poderá ser testada, e maior será
o grau de corroboração atingido pela hipótese ou teoria se suas previsões se
confirmarem.
o) Uma nova teoria será melhor
que uma teoria antiga de for capaz de explicar tudo que esta já explicava e,
além disso ,prever fatos novos, formular previsões mais precisas – corrigindo
as previsões anteriores – refutar algumas dessas previsões e ainda estabelecer
os limites dentro dos quais a teoria antiga poderá ser utilizada na prática.
Para que o nosso conhecimento progrida, também é
necessário que a nova teoria seja corroborada .
p) Embora o grau de
corroboração não nos diga nada sobre o desempenho futuro de uma teoria, o mais
racional é escolher a teoria mais corroborada uma vez que ela é, também, a
teoria que melhor resistiu ás críticas, - pois a atitude racional é,
essencialmente, uma atitude crítica . No entanto, é discutível afirmar que as
teorias mais corroboradas são também as de maior verossimilitude, isto é, as
que mais se aproximam da verdade. Apesar disso, devemos buscar teorias cada vez
mais amplas, precisas, profundas e possivelmente verdadeiras (no sentido de que
resistiram, até o momento, a severas tentativas de refutação).
q) Se abdicarmos da discussão
crítica, das idéias de objetividade, verdade, refutabilidade, etc. estaremos
não apenas impedindo o progresso do conhecimento, mas também estimulando
decisões dogmáticas e arbitrárias, baseadas no uso da força e da autoridade.
r) Para que um conhecimento
seja considerado científico, ele deve ser considerado conjectural,
procurando-se criticar suas idéias através de argumentos lógicos e procurado
refutar suas hipóteses através de testes severos.
s) Devido a ausência de testes controlados, a
busca de leis gerais precisas e profundas ,e ao emprego reduzido da lógica , o
conhecimento comum é eficaz apenas dentro de certos limites, possuindo um nível
crítico inferior ao do conhecimento científico.
t) As pseudociências
caracterizam-se pelo uso pouco freqüente do método crítico, tendo, portanto, um
caráter estático e dogmático. Uma vez que seus seguidores, não raros, acham que
descobriram a verdade, elas não se modificam muito ao longo do tempo ,
tornando-se, consequentemente, impermeáveis a críticas.
DIVISÃO EPISTEMOLÓGICA
Uma distinção importante no estudo “epistemológico”
das teorias cientificas, e que nos será útil no restante deste trabalho, e
aquela entre teorias "construtivas" e teorias
"fenomenológicas". Essa distinção diz respeito a natureza das
proposições da teoria, e consequentemente ao tipo de explicação que fornecem
para os fenômenos.
TEORIAS
FENOMENOLÓGICAS:
Classificam-se como tais as teorias cujas proposições
se refiram "exclusivamente" a propriedades e relações empiricamente
acessíveis entre os fenômenos ("Fenômeno": aquilo que aparece aos
sentidos). Essas proposições descrevem, conectam e integram os fenômenos,
permitindo a dedução de conseqüências empiricamente observáveis. Exemplos
importantes de teorias fenomenológicas são a termodinâmica, a teoria da
relatividade especial e a teoria da seleção natural de Darwin-Wallace.
TEORIAS
CONSTRUTIVAS:
Em contraste com as teorias fenomenológicas, as
teorias construtivas envolvem proposições referentes a entidades e processos
inacessíveis a observação direta, que são postulados com o objetivo de explicar
os fenômenos através de sua "construção" a partir dessa suposta
estrutura fundamental subjacente. Exemplos característicos desse tipo de teoria
são a mecânica quântica, a mecânica estatística, o eletromagnetismo, a genética
molecular e grande parte das teorias químicas.
E importante observar que essas duas categorias de
teoria não são conflitantes, no sentido de que e possível que um mesmo conjunto
de fenômenos seja tratado por duas teorias, uma fenomenológica e outra
construtiva; nesse caso, a ultima vai alem da primeira no nível explicativo,
desse modo complementando-a. Há de tal situação um exemplo notável na física,
que e a coexistência da termodinâmica com a mecânica estatística."
CONCLUSÃO
A ciência não é uma coleção de fatos e teorias
definitivamente estabelecidas, mas um conhecimento racional – porque crítico-,
conjectural, provisório ,sempre capaz de ser questionado e corrigido.A ciência
não é uma representação completa e perfeita de fenômenos diretamente
observáveis , mas uma reconstrução idealizada e parcial da realidade, que
explica o
visível pelo invisível.
O cientista não realiza uma observação pura e imparcial
dos fatos, mas uma observação guiada por hipóteses e teorias .O cientista não
descobre nem verifica hipóteses por procedimentos indutivos, mas inventa
conjecturas ousadas, surgida de sua imaginação, que serão testadas o mais
severamente possível, através de tentativas de refutação que façam uso de
experimentos controlados. Desse modo, ele busca teoria cada vez mais amplas,
precisas, profundas, de maior grau de corroboração ,com maior poder preditivo
e, talvez, mais próximas da verdade . Finalmente , a visão de ciências exposta
neste trabalho pode e deve ser criticada .Novos critérios para avaliar
hipóteses e teorias científicas devem (e estão sendo ) proposto. É
desnecessário dizer que estes critérios, por sua vez, devem também ser
criticados, visto que a
ausência de discussão crítica e a aceitação passiva e
dogmática de um conjunto de idéias e teorias é a não ciência, é pseudociência,
enfim, a negação do espírito crítico e da racionalidade do homem.
Estudo sobre Lakatos
CONSIDERAÇÕES SOBRE O MÉTODO
Neste roteiro é apresentado anotações sobre os
modernos conceitos de ciência do filósofo Silvio Chibeni, a destacarem-se para
esta parte dos estudos os artigos "Concepções de Ciência". No seu
trabalho intitulado Concepções de Ciência o filósofo oferece-nos de maneira
clara e didática os modernos conceitos de Ciência, os quais cito abaixo:
"Do que vimos
sobre as limitações das concepções indutivista e falseacionista de ciência,
transparece que representam as teorias cientificas e suas relações com a
experiência de modo demasiadamente simples e fragmentário. A inspeção da
natureza, gênese e desenvolvimento das teorias cientificas reais evidencia que
devem ser consideradas como "estruturas" complexas e dinâmicas, que
nascem e se elaboram gradativamente, em um processo de influenciação reciproca
com a experiência, bem como com outras teorias. Essa
visão da ciência e
ainda suportada por argumentos de ordem filosófica e metodológica.
Se é verdade que as
teorias cientificas devem apoiar-se na experiência - embora não dos modos
descritos pelo indutivismo e pelo falseacionismo -, residindo mesmo nela a sua
principal raison
d'etre, não é menos verdade que a busca, condução, classificação e analise dos
dados empíricos
requer diretrizes teóricas." (Obs: raison d'etre = razão
de ser).
Por fim, em
contraste com o que propões a visão indutivista (e talvez também a
falseacionista), as
teorias cientificas não se consistem de meros aglomerados de leis gerais.
Devem incorporar
ainda regras metodológicas que disciplinem a absorção de impactos empíricos
desfavoráveis, e norteiem as pesquisas futuras com vistas ao seu
aperfeiçoamento."
PROGRAMA DE PESQUISA
O filósofo Imre Lakatos sistematizou de maneira
interessante as características da ciência que vimos discutindo, introduzindo a
noção de "programa cientifico de pesquisa". Iniciaremos nossa breve e
simplificada exposição das idéias centrais de Lakatos recorrendo a este
parágrafo do citado livro de Chalmers (CHALMERS, A.F. What is this Thing called
Science? St. Lucia, University of Queensland Press, 1976, p. 76):
Um "programa de
pesquisa" lakatosiano é uma estrutura que fornece um guia para futuras pesquisas,
tanto de uma maneira positiva, como negativa. A "heuristica negativa"
de um programa envolve a estipulação de que as assunções básicas subjacentes ao
programa, que formam o seu "núcleo rígido", não devem ser rejeitadas
ou modificadas. Esse núcleo rígido e resguardado contra falseações por um
"cinturão protetor" de hipóteses auxiliares, condições iniciais, etc.
A "heurística positiva" constitui-se de prescrições não muito
precisas que indicam como o programa deve ser desenvolvido... Os programas de
pesquisa são considerados "progressivos" ou "degenerantes",
conforme tenham sucesso, ou persistentemente fracassem, em levar a descoberta
de novos fenômenos.
NÚCLEO RÌGIDO
O núcleo rígido
(hard core) de um programa é aquilo que essencialmente o identifica e caracteriza,
constituindo-se de uma ou mais hipóteses teóricas. Eis alguns exemplos. O
núcleo rígido da cosmologia aristotélica inclui, entre outras, as hipóteses da
finitude e esfericidade do Universo, a impossibilidade do vazio, os movimentos
naturais, a incorruptibilidade dos céus. O núcleo da astronomia copernicana
consiste das assunções de que a Terra gira sobre si mesma em um dia e em torno
do Sol em um ano, e de que os demais planetas também orbitam o Sol. O da
mecânica newtoniana e formado das três leis dinâmicas e da lei da gravitação
universal. O da teoria especial da relatividade, o principio da relatividade e
a constância da velocidade da luz; o da teoria da evolução de Darwin-Wallace, o
mecanismo da seleção natural.
HEURÍSTICA NEGATIVA
Por "uma
decisão metodológica de seus protagonistas" (Lakatos 1970, p. 133), o
núcleo rígido de um programa de pesquisa e "decretado" não-refutavel.
Possíveis discrepâncias com os resultados empíricos são eliminadas pela
modificação das hipóteses do cinturão protetor.
Essa regra e' a heurística negativa do programa, e tem
a função de limitar, metodologicamente, a incerteza quanto a parte da teoria
atingida pelas "falseações".
Recomendando-nos direcionar as "refutações"
para as hipóteses não-essenciais da teoria, a heurística negativa representa
uma regra de tolerância, que visa a dar uma chance para os princípios
fundamentais do núcleo mostrarem a sua potencialidade. O testemunho da historia
da ciência parece de fato corroborar essa regra, como vimos nos exemplos que
demos acima.
Uma certa dose de obstinação parece ter sido essencial
para salvar nossas melhores teorias cientificas dos abundantes problemas de
ajuste empírico que apresentavam quando de seu nascimento.
Lakatos reconhece, porém, que essa atitude
conservadora tem seus limites. Quando o programa como um todo mostra-se
sistematicamente incapaz de dar conta de fatos importantes, e de levar a
predição de novos fenômenos (i.e., torna-se "degenerante"), deve
ceder lugar a um programa mais adequado, "progressivo". Como uma
questão de fato histórico, nota-se que um programa nunca e abandonado antes que
um substituto melhor esteja disponível.
HEURÍSTICA POSITIVA
A heurística positiva de um programa é mais vaga e
difícil de caracterizar que a
heurística negativa. Segundo Lakatos, ela consiste
"de um conjunto parcialmente articulado de sugestões ou idéias de como
mudar ou desenvolver as 'variantes refutáveis' do programa de pesquisa, de como
modificar, sofisticar, o cinturão protetor 'refutável'." (op. cit. p. 135)
No caso da astronomia copernicana, por exemplo, a heurística positiva indicava
claramente a necessidade do desenvolvimento de uma mecânica adequada a hipótese
da Terra móvel, bem como de novos instrumentos de observação astronômica,
capazes de detectar as previstas variações no tamanho aparente dos planetas e
as fases de Vênus, por exemplo. Assim, o telescópio foi construído algumas
décadas após a morte de Copérnico pelo seu ardente defensor, Galileu, que
também principiou a criação da nova mecânica. Esta, a seu turno, uma vez
concebida por Newton, apontou para um imenso campo aberto, no qual se deveria
buscar uma nova matemática, medidas das dimensões da Terra, aparelhos para a
detecção da forca gravitacional entre pequenos objetos, etc."
Tomando o exemplo de um dos mais bem sucedidos
programas de pesquisa da Física, a Mecânica Newtoniana, vemos que possui um
núcleo rígido formado pelas três leis newtonianas do movimento e pela lei da
gravitação universal, que a heurística negativa do programa recomenda sejam
mantidas inalteradas: eventuais discrepâncias com a experiência devem ser eliminadas
através de ajustes nas hipóteses auxiliares do cinturão protetor. Esse processo
ocorreu várias vezes durante o desenvolvimento do programa, como quando, no
século XIX, se verificou que as previsões teóricas para a trajetória do planeta
Urano conflitavam com os dados da observação astronômica; ao invés de imputar
esse desvio a possível falsidade das leis do núcleo rígido, assumiu-se que
deveria existir um corpo celeste desconhecido perturbando a trajetória do planeta;
mais tarde, foi, de fato, observada a existência desse corpo, o planeta Netuno.
Assim como nesse episódio, a conjunção das heurísticas negativa e positiva do
programa newtoniano levou à inúmeros desenvolvimentos: novas teorias ópticas,
novos aparelhos e técnicas de observação, criação de novos ramos da Matemática
etc. A partir do início de nosso século, porém, o programa tornou-se
degenerante, por motivos vários que não cabe expor aqui, vindo a ser
substituído pelos programas das Teorias da Relatividade e da Mecânica Quântica.
CRITÉRIOS DE DEMARCAÇÃO
Como podemos notar da citação acima, os modernos
conceitos de ciência, mais realistas, deixam transparecer o caráter claramente
humano da ciência, que passa a ser então vista como um fruto das convicções de
um grupo social (que "decreta" que o núcleo rígido de seu programa de
pesquisa é não-refutável), com todo o seu conteúdo de crenças e descrenças e,
portanto, de subjetivismo. Enfim, assume-se claramente a realidade de que não
existe um método "objetivo e seguro" de se fazer ciência.
"A concepção
lakatosiana de ciência envolve um novo critério de demarcação entre ciência e não-ciência.
Lembremos que o critério indutivista considerava cientificas somente as teorias
provadas empiricamente. Tal critério é, como vimos, forte demais: não haveria,
segundo ele, nenhuma teoria genuinamente cientifica, pois todo conhecimento do
mundo exterior e falível. Também o critério falseacionista, segundo o qual só
são cientificas as teorias refutáveis, elimina demais: como nenhuma teoria pode
ser rigorosamente falseada, nenhuma poderia classificar-se como cientifica.”
O critério de demarcação proposto por Lakatos, por
outro lado, adequadamente situa no campo cientifico algumas das teorias
unanimemente tidas como cientificas, como as grandes teorias da física. Esse
critério funda-se em duas exigências principais: uma teoria deve, para ser
cientifica, estar imersa em um programa de pesquisa, e este programa deve ser progressivo.
Deixemos a Lakatos a palavra (1970, pp. 175-6):
“Pode-se compreender muito pouco do
desenvolvimento da ciência quando nosso paradigma de uma porção de conhecimento
cientifico e uma teoria isolada, como 'Todo cisne é branco', solta no ar, sem
estar imersa em um grande programa de pesquisa. Minha abordagem implica um novo
critério de demarcação entre 'ciência madura', que consiste de programas de
pesquisa, e 'ciência imatura', que consiste de uma colcha de retalhos de tentativas
e erros ..."
"A ciência
madura consiste de programas de pesquisa nos quais são antecipados não apenas fatos
novos, mas também novas teorias auxiliares; a ciência madura possui 'poder heurístico',
em contraste com os processos banais de tentativa e erro." Lembremos que
na heurística positiva de um programa vigoroso há, desde o inicio, um esboço
geral de como construir os cinturões protetores: esse poder heurístico gera
"a autonomia da ciência teórica".
Essa "exigência
de crescimento continuo" [progressividade do programa] e minha reconstrução
racional da exigência amplamente reconhecida de 'unidade' ou 'beleza' da ciência.
Ela põe a descoberto a fraqueza de "dois" tipos de teorização
aparentemente muito diferentes entre si. Primeiro, evidencia a fraqueza de
programas que, como o marxismo ou o freudismo, são indubitavelmente
'unificados', e fornecem um plano geral do tipo de teorias auxiliares que irão
utilizar para a absorção de anomalias, mas que invariavelmente criam suas
teorias na esteira dos fatos, sem ao mesmo tempo anteciparem fatos novos. (que fatos
novos o marxismo "previu" desde, digamos, 1917?) Em segundo lugar,
ela golpeia seqüências remendadas de ajustes 'empíricos' rasteiros e sem
imaginação, tão freqüentes, por exemplo, na psicologia social moderna. Tais
ajustes podem, com o auxilio das chamadas 'técnicas estatísticas', produzir
algumas predições 'novas', podendo mesmo evocar alguns fragmentos irrelevantes
de verdade que encerrem. Semelhantes teorizações, todavia, não possuem nenhuma
idéia unificadora, nenhum poder heurístico, nenhuma continuidade. Não indicam
nenhum programa de pesquisa, e são, no seu todo, inúteis."
CONCEPÇÃO MODERNA DE CIÊNCIA
Fica assim apresentada uma das concepções modernas de
ciência, as quais colocam o fazer ciência sob uma perspectiva muito mais
realista: fazer ciência e' uma atividade humana como outra qualquer, e como tal
está sujeita às convicções e julgamentos dos grupos sociais que a realizam.
Enfim, volto a frisar, me parece claro que não existe uma forma segura e
objetiva de se extrair conhecimento cientifico mesmo a partir dos fatos. A
ciência é muito mais complexa do que se poderia supor a partir das concepções
positivistas, pois tem-se que elaborar teorias cientificas apesar de toda a
subjetividade e insegurança intrínsecas ao psiquismo humano.
O ESPIRITISMO COMO CIÊNCIA
“O Espiritismo é uma ciência que
trata da natureza, origem e destino dos Espíritos, bem como de suas relações
com o mundo corporal.”
Allan
Kardec, Qu'est-ce que le Spiritisme, Preâmbulo.
CIÊNCIA DO ESPÍRITO
A inspeção meticulosa e isenta das origens, estrutura
e desenvolvimento do Espiritismo revela que ele possui todos esses requisitos
de uma ciência genuína. Allan Kardec
admiravelmente antecipou-se as conquistas recentes da Filosofia da Ciência, e compreendeu
essa realidade. Sua visão de ciência, exposta explicita e implicitamente em seus
escritos, corresponde a visão moderna e justa . Isso teve a conseqüência feliz
de que, ao travar contato com uma nova ordem de fenômenos, Kardec empregou em
sua investigação
métodos e critérios corretos, o que possibilitou o
surgimento de uma verdadeira Ciência do Espírito.
O corpo teórico fundamental do Espiritismo encontra-se
delineado em O Livro
dos Espíritos. O exame dessa obra revela sua consistência e seu alto grau de
coesão, uma notável concatenação das diversas leis, a amplitude de seu escopo,
e o perfeito casamento da teoria com os fatos. Ademais, ali estão
implicitamente presentes as diretrizes que nortearam os desenvolvimentos
ulteriores das investigações espíritas. Parte significativa desses
desenvolvimentos foi, como se sabe, levada a cabo pelo próprio Kardec, e se
acham completados nas demais obras que escreveu. Consoante com a natureza de
uma verdadeira ciência, o desenvolvimento experimental e teórico do Espiritismo
prossegue até hoje, pelos esforços de pesquisadores encarnados e
desencarnados."
Contrariamente ao que alguns críticos mal informados
acerca do Espiritismo e das teorias cientificas contemporâneas alegam, o
Espiritismo não conflita com qualquer uma das teorias cientificas maduras, quer
da Física, quer da Química ou da Biologia. É de crucial importância notar, como
o fez Kardec, que embora o Espiritismo seja uma ciência, ele não se confunde
com as referidas “ciências”, do mesmo modo como elas não se confundem entre si.
Os domínios de fenômenos por elas tratados não coincidem, sendo antes
complementares.
BASE EXPERIMENTAL
No caso do principio espírita da existência do
espírito (bem como de vários outros dos princípios básicos do Espiritismo),
Trata-se de um principio pertencente a classe de princípios a que os filósofos
denominam "fenomenológicos", que estão na base do edifício do conhecimento,
dado o seu alto grau de certeza. Proposições dessa classe são, por exemplo, as
de que o Sol existe, de que o fogo queima e a cicuta envenena, a de que
determinado familiar veio nos visitar no dia tal e nos deixou uma caixa de
bombons, etc. Nestes casos, embora explicações alternativas sejam "em
principio" possíveis, elas são tão inverossímeis que não merecem o
assentimento de nenhum ser racional. Notemos que a inferência espírita diante
de um fenômeno de efeitos intelectuais não difere em nada das inferências que fazemos
a partir dos fenômenos ordinários. Quando, por exemplo, o carteiro traz a nossa
casa um papel no qual lemos certas frases, não nos acudira a cabeça a idéia de
que elas não foram escritas por um determinado amigo, por exemplo, quando
relatam fatos, contem expressões e expressam pensamentos peculiares e íntimos.
Exatamente o mesmo se da com os abundantes e variados casos de psicografia de
que todos somos testemunha. Não constitui exagero, pois, afirmar-se que a
constatação cuidadosa de uns poucos casos dessa espécie (como por exemplo os que
nos tem oferecido a extraordinária mediunidade de Chico Xavier) e suficiente
para eliminar qualquer duvida.
Como se isso não bastasse, a base experimental do
Espiritismo incorpora ainda muitos outros tipos de fenômenos, como a psicofonia,
a xenoglossia, as materializações, os casos de vidência, a pneumatografia e a
pneumatofonia, etc. Além desses fenômenos, que formam uma classe especifica, a
dos fenômenos espíritas, o Espiritismo apóia-se também, em virtude de
oferecer-lhes explicações cientificas, em uma multidão de fenômenos ordinários.
Referimo-nos, por exemplo, as nossas inclinações e sentimentos, as peculiaridades
de nosso relacionamento com as pessoas que nos cercam, aos
acontecimentos marcantes de nossas vidas, aos
distúrbios da personalidade, aos efeitos psicossomáticos, aos sonhos, a
evolução das espécies e das civilizações, etc.
O ESPIRITISMO É
CIENTÍFICO
Evidentemente, o estatuto científico de uma teoria não
pode ser decidido através da mera deliberação de se definir como uma
"ciência". Esse atributo é inerente à natureza intrínseca da teoria,
e não à denominação que se lhe dê. A tarefa de determinar quais as
características de uma teoria são necessárias e suficientes ao seu
enquadramento na categoria de ciência cabe à sub-área da Filosofia intitulada
Filosofia da Ciência. Essa disciplina, assim como outros ramos do saber, vem
evoluindo constantemente. Em seu caso específico, progressos essenciais
ocorreram no século XX, e, mais acentuadamente, a partir da década de 60. Os trabalhos
de vários filósofos, entre os quais Karl Popper, Willard Quine, Thomas Kuhn,
Paul Feyerabend e Imre Lakatos, evidenciaram graves problemas na concepção de
ciência que prevaleceu durante séculos, e ainda hoje é muito freqüente
encontrar-se entre os não filósofos.
Muito simplificadamente, poderíamos dizer que pelo
menos desde o surgimento da ciência moderna, por volta do século XVII,
acreditava-se que a Ciência consistia na catalogação neutra de um grande número
de "fatos", dos quais então resultariam, de maneira
"espontânea", certa e infalível, as leis gerais que o regem; a
reunião de tais leis constituiria então uma teoria científica.
Conforme mencionamos, essa visão "clássica"
de ciência mostrou-se insustentável.
Percebeu-se que a descrição, busca e classificação dos
fatos necessariamente envolve pressuposições teóricas de um tipo ou de outro;
que nenhuma lei teórica pode resultar lógica e infalivelmente de um conjunto de
fatos, qualquer que ele seja; que uma teoria científica não é um simples amontoado
de leis, sendo, antes, uma estrutura dinâmica complexa, na qual participam elementos
de diversas naturezas, como resultados observacionais, hipóteses livremente concebidas,
regras para o desenvolvimento futuro da teoria, decisões metodológicas, fragmentos
de outras teorias etc.
Um Programa de
Pesquisa LAKATOSIANO
Imre Lakatos sistematizou as novas idéias surgidas na
Filosofia da Ciência, propondo que a atividade científica desenvolve-se em
torno do que denominou "programa científico de pesquisa". Um tal
programa de pesquisa consiste, em termos simplificados, de um "núcleo rígido"
de hipóteses teóricas básicas, suplementado por um "cinturão
protetor" de hipóteses auxiliares, que serve para ligar e ajustar o núcleo
aos fenômenos de que a ciência trata. A cada
programa ainda estão associadas duas
"heurísticas", uma "negativa", que é a decisão metodológica
de se manter inalteradas as hipóteses do núcleo, e outra "positiva",
que é um conjunto de sugestões ou idéias de como mudar ou desenvolver o
cinturão protetor de modo que o programa dê conta de novos fenômenos e explique
os já conhecidos de maneira mais precisa.
Um programa de pesquisa é dito "progressivo"
caso leve sistematicamente à descoberta de novos fatos, que sejam por ele
explicados; caso contrário, será dito "degenerante".
O Espiritismo traz em si todas as características de
um programa de pesquisa progressivo, sendo, portanto, genuinamente científico,
segundo o critério lakatosiano.
Possui um núcleo
rígido formado pelo:
· princípio da existência de uma
"inteligência suprema, causa primária de todas as coisas", dotada da
suprema justiça e bondade;
· pela lei de causa e feito;
· pela imortalidade dos seres vivos;
· por sua evolução ilimitada;
· pela existência do livre arbítrio, a partir de
determinado estágio evolutivo.
Desse núcleo pode-se, com o auxílio da lógica
("raciocínio") e de assunções auxiliares, deduzir
("explicar") a infinidade de fenômenos de que trata o Espiritismo: os
fenômenos mediúnicos e anímicos, a evolução dos seres, seus estados psicológicos,
sua condição após a morte etc. Todos esses fato, analisados extensiva e
objetivamente pelo Espiritismo, embasam e
sancionam o corpo de seus princípios teóricos; este, a
seu turno, concatena, torna inteligíveis, explica aqueles fatos.
PERSPECTIVAS DA
CIÊNCIA ESPÍRITA
Com a lucidez cientifica que lhe era peculiar, Allan
Kardec apontou diretrizes seguras para o desenvolvimento do Espiritismo. De um
lado, temos suas análises que advertem contra os métodos e procedimentos
anti-científicos que poderiam embaraçar a marcha do Espiritismo, ou seja 1)
preconceitos e interesses diversos; e 2) falta de um corpo teórico que norteie
a pesquisa experimental.
Kardec legou-nos investigações paradigmáticas sobre os
tópicos mais fundamentais da ciência espírita, que serviram de modelo pra os
pesquisadores que vieram após ele, e que devem continuar desempenhando essa
tarefa nas pesquisas futuras. Simplificadamente, poderíamos classificar assim
as áreas principais de investigação espírita:
1) Evolução do espírito: o elemento espiritual
dos seres dos reinos inferiores; origem dos espíritos humanos; encarnação e
reencarnação; pluralidade dos mundos habitados;
2) O mundo espiritual;
3) Interação espírito-corpo: perispirito,
efeitos psicossomáticos, mediunidade;
4) Implicações morais (uma área cientifica e
filosófica): livre-arbítrio, lei de causa e efeito.
ANTECIPAÇÕES DE KARDEC
Allan Kardec percebeu, em admirável antecipação às
conquistas recentes da Filosofia da Ciência, a importância fundamental dessa
"simbiose" entre fenômeno e teoria, e expendeu extensos comentários
sobre ela em várias de suas obras. Os três capítulos iniciais da primeira parte
de O Livro dos Médiuns, por exemplo, são uma obra prima de argumentação
filosófica que, embora visando à elucidação de uma questão ligeiramente
diferente, contém valiosos elementos relevantes ao assunto que estamos
analisando. Comecemos por estas considerações do Parágrafo 19:
“É
crença geral que, para convencer, basta apresentar fatos. Esse, com efeito,
parece o caminho mais lógico. Entretanto, mostra a experiência que nem sempre é
o melhor, pois que a cada passo se encontram pessoas que os mais patentes fatos
absolutamente não convenceram. A que se deve atribuir isso? É o que vamos
tentar demonstrar.”
No Parágrafo 29 Kardec volta ao ponto:
“Podemos dizer que, para a maioria dos que não
se preparam pelo raciocínio, os fenômenos materiais quase nenhum peso têm.
Quanto mais extraordinários são esses fenômenos, quanto mais se afastam das
leis conhecidas, maior oposição encontram e isto por uma razão muito simples: é
que todos somos naturalmente a duvidar de uma coisa que não tem sanção
racional. Cada um a considera de seu ponto de vista e a explica a seu modo
[...]. “
Essa "sanção racional" é a que advém da
explicação dos fatos através da teoria. No Parágrafo 34, após ressaltar a
importância dos fatos na fundamentação da teoria, Kardec considera, por outro
lado, que de dez pessoas novatas que assistam a uma sessão de experimentação
espírita "nove sairão sem estar convencidas e algumas mais incrédulas do
que antes, por não terem as experiências correspondido ao que esperavam".
Prossegue então Kardec:
O inverso se dará com as que puderem compreender os
fatos, mediante antecipado conhecimento teórico. Paras estas pessoas, a teoria
constitui um meio de verificação, sem que coisa alguma as surpreenda, nem mesmo
o insucesso, porque sabem em que condições os fenômenos se produzem e que não
se lhes deve pedir o que não podem dar. Assim, pois, a inteligência prévia dos
fatos não só as coloca em condições de se aperceberem de todas as anomalias,
mas também de apreenderem um sem número de particularidades, de matizes, às vezes
muito delicados, que escapam ao observador ignorante.
Considerações interessantes nesse mesmo sentido
encontram-se também em O que é o Espiritismo. No diálogo com o Crítico (Cap. I,
Primeiro Diálogo) Kardec pondera, em resposta à solicitação que este lhe faz de
permissão para assistir a algumas experiências:
“E julgais que isto vos baste para poder, ex
professo, falar de Espiritismo? Como poderíeis compreender essas experiências
e, ainda mais, julgá-las, quando não estudaste os princípios em que elas se
baseiam? Como apreciaríeis o resultado, satisfatório ou não, de ensaios metalúrgicos,
por exemplo, não conhecendo a fundo a metalurgia? “
Mais adiante, no diálogo com o Céptico (Cap. I,
Segundo Diálogo, seção "Elementos de convicção") Kardec coloca a
questão em termos explícitos:
“Há duas coisas no Espiritismo: a parte
experimental das manifestações e a doutrina filosófica. Ora, eu sou todos os
dias visitado por pessoas que ainda nada viram e crêem tão firmemente como eu,
pelo só estudo que fizeram da parte filosófica; para elas o fenômeno das manifestações
é acessório; o fundo é a doutrina, a ciência; eles a vêem tão grande, tão
racional, que nela encontram tudo quanto possa satisfazer às suas aspirações
interiores, à parte o fato das manifestações; do que concluem que, supondo não
existissem as manifestações, a doutrina não deixaria de ser sempre a que melhor
resolve uma multidão de problemas reputados insolúveis.
Quantos me disseram que essas idéias estavam em
germe no seu cérebro, conquanto em estado de confusão. O Espiritismo veio
coordená-las, dar-lhes corpo, e foi para eles como um raio de luz. É o que
explica o número de adeptos que a simples leitura de O Livro dos Espíritos produziu.
Acreditais que esse número seria o que é hoje, se nunca tivéssemos passado das
mesas girantes e falantes?“
A primeira sentença que destacamos revela uma vez mais
que Kardec localizava o caráter científico do Espiritismo na
"doutrina", na sua "parte filosófica", que, no contexto de
nossa análise, deve ser entendido como aquilo a que vimos denominando
"teoria". Os fatos em si não constituem a ciência.
Nosso segundo destaque mostra que Kardec já entendia o
papel da teoria como dando "corpo", ou seja, coesão,
inteligibilidade, aos fenômenos, que é a tarefa que Lakatos atribui aos princípios
teóricos do programa de pesquisa, notadamente os de seu núcleo rígido.
CIÊNCIA X ESPIRITISMO
Três outros aspectos importantes no desenvolvimento do
Espiritismo foram enfatizados por Kardec. No item VII da Introdução de O Livro
dos Espíritos, Kardec afirma que "o Espiritismo não e' da alçada da
ciência". Evidentemente, trata-se aqui das ciências acadêmicas, ou seja, da
Física, da Química e da Biologia. O argumento para tal assertiva baseia-se nas
peculiaridades do objeto de estudo e métodos do Espiritismo e das referidas
ciências, assunto este tratado acima. Vale a pena reproduzir aqui, por sua
propriedade, o arrazoado que, no texto, antecede a assertiva em questão:
As ciências ordinárias assentam nas propriedades da
matéria, que se pode experimentar e manipular livremente. Os fenômenos
espíritas repousam na ação de inteligências dotadas de vontade própria e que
nos provam a cada instante não se acharem subordinadas aos nossos caprichos. As
observações não podem, portanto, ser feitas da mesma forma; requerem condições
especiais e outro ponto de partida. Querer submetê-las aos processos comuns
de investigação é estabelecer analogias que não
existem. A ciência propriamente dita, é, pois, como ciência, incompetente para
se pronunciar na questão do Espiritismo: não tem que se ocupar com isso, e
qualquer que seja o seu julgamento, favorável ou não, nenhum peso poderá ter.”
As relações entre o Espiritismo e as ciências
ordinárias são, antes, de complementaridade, como também notou Kardec. No
parágrafo 16 do Capitulo I de A Gênese, lemos a seguinte frase, ao final de uma
extensa argumentação: "O Espiritismo e a ciência completam-se
reciprocamente".
O segundo aspecto importante a ser notado liga-se
parcialmente ao precedente: Kardec observa que não apenas existe uma relativa
autonomia entre o Espiritismo e as ciências ordinárias como
também os cientistas das academias não estão, pelo simples fato de serem cientistas,
mais capacitados do que as demais pessoas para se pronunciar nas questões relativas
ao Espiritismo. O assunto é abordado, entre outros lugares, em uma das
respostas ao Céptico de O que é o Espiritismo (Cap. I, Segundo dialogo, seção
"Oposição da ciência").
Vejamos estes trechos significativos:
"Concordai, também, que ninguém pode ser
bom juiz naquilo que esta fora de sua competência. Se quiserdes edificar uma
casa, confiareis esse trabalho a um musico? Se estiverdes enfermo, far-vos-eis
tratar por um arquiteto? Se estais a braços com um processo, ides consultar um
dançarino? Finalmente, quando se trata de uma questão de teologia, alguém ira
pedir a solução a um químico ou a um astrônomo? Não; cada um em sua
especialidade. (...)"
"A ciência enganou-se quando quis
experimentar os Espíritos como o faz com uma pilha voltaica; foi mal sucedida,
como devia ser, porque agiu pressupondo uma analogia que não existe; e depois,
sem ir mais longe, concluiu pela negação, juízo temerário que o tempo se encarrega
de ir emendando diariamente, como já o fez com tantos outros. (...)"
"As corporações cientificas não devem, nem
jamais deverão pronunciar-se nesta questão; ela esta tão fora dos limites do
seu domínio como a de decretar se Deus existe ou não; e', pois, um erro
tomá-las aqui por juiz."
Kardec lembra aqui que cada um é competente em sua
especialidade, que alguém que haja se especializado no estudo de determinada
ordem de fenômenos materiais (um físico ou um biólogo, por exemplo), não
adquire, "por esse simples fato", competência para se pronunciar sobre
uma ordem de fenômenos completamente diferentes, "a menos",
obviamente, que essa pessoa tenha se dedicado séria e longamente ao seu estudo.
Não devemos, pois, cair no erro freqüente hoje em dia de atribuir aos
cientistas das academias uma superioridade que eles de fato não possuem na
avaliação das pesquisas espíritas.
Por fim, Kardec tomou um extremo cuidado em preservar,
e recomendar a preservação, da coerência e integridade da ciência espírita,
pela não-intromissão em sua estrutura teórico-conceitual de elementos
heterogêneos, oriundos de outros programas de pesquisa. Kardec dotou o
Espiritismo de um arsenal conceitual-nomológico próprio, e qualquer
desenvolvimento da teoria espírita deve fazer-se recorrendo-se aos seus
elementos, ou, se algum acréscimo se fizer necessário, o elemento adicionado
não pode conflitar com as leis básicas bem estabelecidas do Espiritismo.
Notemos que precauções semelhantes são tomadas na evolução das ciências
ordinárias. No caso do Espiritismo, é admirável que ao propor o referido corpo
de conceitos e leis, Kardec teve a lucidez de não admitir elementos demasiadamente
vulneráveis às transformações futuras das ciências. É assim que o Espiritismo é
uma teoria fenomenológica, pelo menos em seus fundamentos. Kardec não se aventurou,
por exemplo, a formular modelos para o perispírito, ou explicações técnicas para
os fenômenos mediúnicos em termos de conceitos e princípios vulneráveis das
ciências de seu tempo. Retrospectivamente, vemos agora que isso
providencialmente preservou o Espiritismo das reviravoltas profundas ocorridas
nas ciências, durante as primeiras décadas de nosso século. Espelhando-nos na
atitude prudente de Kardec, não devemos, por nossa vez, procurar fazer o que
ele não fez, e prematuramente associar o Espiritismo às teorias cientificas
contemporâneas. A progressividade do Espiritismo, uma de suas características
essenciais, dado que é uma ciência que se apóia em fatos, não significa a absorção
irrestrita de qualquer teoria que apareça.
Essa advertência foi claramente exposta no parágrafo
55 do Capitulo I de A Gênese (grifamos):
"Entendendo com todos os ramos da economia
social, aos quais dá o apoio das suas próprias descobertas, [o Espiritismo] assimilará
sempre todas as doutrinas progressivas, de qualquer ordem que seja, "desde
que hajam atingido o estado de verdades praticas e abandonado o domínio da
utopia", sem o que se suicidaria."
CONSIDERAÇÕES SOBRE
METODOLOGIA
Os fatos espíritas são perfeitamente estudados via
teoria cientifica (a própria Doutrina Espírita), e são genuinamente
científicos. O contrario é SIM falso. Foi dito que a `metodologia científica'
exige que um fato, para ser cientifico (isto é, analisável via ciência),
necessita ser universal, quer dizer, seja reprodutível até a exaustão por
qualquer cientista, a qualquer momento e em qualquer parte do mundo
(implicitamente também acrescente, reprodutível em laboratório...). Essa idéia
foi, na verdade, criada por conveniência para não se estudar os fatos
espíritas. Esses fatos, por si só, são suficientes para provocar uma revisão
profunda na idéia que se tem em geral do mundo, e aqueles que não estão
dispostos a fazer tal revisão lançam e lançaram mão de diversos argumentos,
desde a negação pura dos fatos, os argumentos de charlatanismo e truque, até
argumentos aparentemente mais sofisticados como esse. Uma simples analise,
porem, mostra sua fraqueza: - Por acaso a Meteorologia e' feita de fenômenos
repetitiveis por qualquer um, sob as condições exigidas pelo `método
cientifico' proposto por tal argumento? Alguém já pode reproduzir em
laboratório uma tempestade ou um furacão? Será que a Meteorologia não é feita de
fatos científicos e, consequentemente, não e' uma ciência?
- Alguém já viu em laboratório experimentos em colisão
de galáxias? Será que já se conseguiu reproduzir, a vontade, a explosão do Big
Bang ? Será' que a Cosmologia não e' ciência? Percebam que a simulação por
computadores é possível, mas isso é pura teoria!
- Em 1987 houve a explosão de uma estrela próxima,
dentro da galáxia. Os astrônomos e astrofísicos montaram diversos experimentos
para a medição da variação do fluxo de neutrinos pela explosão. Muitas
conclusões perfeitamente cientificas e aceitáveis foram tiradas, sobre um
fenômeno absolutamente incontrolável e que ocorreu uma só vez!! Só' Deus sabe quando
ocorrera' novamente.
- Alguém já' presenciou inumares vezes o aparecimento
de novas espécies de animais e plantas (grandes taxas)? Entretanto a teoria da
evolução das espécies e tomada em alto conceito, e repousa em grande parte
sobre observação e analise de eventos passados (incontroláveis...), vindas da
Paleontologia.
Se fossemos usar tal metodologia cientifica de
limitação dos estudos a apenas os fenômenos reprodutíveis facilmente por
qualquer um, muito diversa seriam as ciências, e muita gente estaria
desempregada. Os meteorologistas, astrofísicos, cosmologistas, evolucionistas e
paleontólogos aplaudiriam com prazer os dizeres de Kardec quanto aos fenômenos
espíritas que se aplicam também a muitos fenômenos materiais: "... não se produzem
à vontade; é necessário que os colhamos de passagem, é observando muito e por muito
tempo que se descobre uma porção de provas que escapam a primeira vista,
sobretudo, quando não se está familiarizado com as condições em que se pode
encontrá-los, e ainda mais quando se vem com o espírito prevenido" ( O que
e' Espiritismo, 15a resposta ao critico, Cap I, 1o dialogo). De acordo com (R
2) vemos que essa pretensa metodologia faz parte de uma doutrina epistemologica
bastante antiga, o Indutivismo, que, por diversos argumentos pode ser mostrada
como sendo insatisfatória e como fazendo parte de uma noção idealizada de
ciência, contraria ao que se constata na Historia da Ciência, e ao próprio
`motus operandi' das ciências em
si. Vejamos agora os fatos espíritas. Tomemos o exemplo da
psicografia. E' certo que o fenômeno completo não pode ser reproduzido à
vontade como se faz evaporar a água por
aquecimento. Mas, convenhamos, é um fenômeno relativamente
controlável. Por exemplo, tendo-se bem claro em mente os mecanismos e forcas
envolvidas nesse fenômeno, é possível enfraquecê-lo ou fazê-lo inatuável.
Kardec enfatizou muito bem a relevância de certos fatores morais, tais como o
tipo de concentração dos presentes na sala onde se realiza a sessão, o tipo de
vibração presente e a intenção com que se pretende observá-lo, que podem ter
papel fundamental no desenvolvimento dos fatos psicográficos. Está claro que o
controle é muito maior do que no caso da explosão de uma estrela distante, os
mecanismos de especificação na teoria de Darwin. Alem disso é um fenômeno que
sensibiliza diretamente os nossos sentidos ordinários, quer dizer, nos não
precisamos de aparelhos para observá-lo (embora alguns pretendem usar
aparelhos...). Em suma e' um fenômeno de impossível contestação racional.
Houveram no passado muitos médiuns que produziram
fenômenos extraordinários.
Maior foi o numero dos sábios que não quiseram ver.
Tudo isso por que o estudo da teoria é de fato fundamental para que haja boa
ciência. É necessário estudarmos para avaliarmos todas as suas conseqüências, e
possíveis aplicações futuras. É necessário estudarmos a Doutrina Espírita com
zelo e profundidade para talvez descobrirmos que ela já nos responde a muitas
coisas, não é necessário buscar em complicações adicionais e argumentos
rebuscados, que passam por toda uma trama de argumentos e fenômenos para nos
certificarmos das realidades do espírito. A simplicidade deve sempre ser
buscada. Essa é, na verdade, a assinatura de toda grande teoria cientifica. As
teorias da Física demonstram esse fato; elas são impressionantemente simples em
suas estruturas, belas em sua descrição do mundo de fenômenos próprios. Assim
também é o Espiritismo. O Espiritismo tem um caráter progressivo, isto é, ele
aceita os cânones das ciências ordinárias quanto aos fenômenos materiais. Eu
acredito que ele é a expressão máxima que podemos vislumbrar de uma teoria que nos
explique o mecanismo das forcas espirituais. Há certamente muitas coisas que
não sabemos sobre essas forcas, mas nosso nível evolutivo não permite que uma
revolução cientifica se instale nele aponto de modificar a maneira atual de
entendermos e aceitarmos seus princípios. Nisso não há dogmatismo, se assim
fosse todos os cientistas seriam dogmáticos, porque eles não abandonam seus
princípios por qualquer fenômeno anômalo que se apresente; há inumeráveis
exemplos dentro da Historia das Ciências. Uma revolução cientifica dentro do
Espiritismo ainda está para acontecer, depois que tivermos progredido muito moralmente,
e tivermos estudado com imparcialidade seus ensinos com respeito ao mundo e meditarmos
com profundidade nas conseqüências desses mesmos ensinos.
O OBJETIVO DO
ESPIRITISMO
Não poderíamos encerrar estes apontamentos sem
mencionar um ponto de crucial importância, sobre o qual Kardec não se cansava
de insistir: O objetivo essencial do Espiritismo é tornar melhor o homem,
convencendo-o, através dos fatos e da razão, de que somente o comportamento
evangélico lhe assegurará um porvir feliz. E é nessa tarefa de esclarecimento
que a ciência espírita é chamada a desempenhar a sua mais importante tarefa, conforme
lemos nos comentários que o Codificador tece as Questões 147 e 148 de "O
Livro dos Espíritos":
"A missão do Espiritismo consiste
precisamente em nos esclarecer acerca desse futuro, em fazer com que, até certo
ponto, o toquemos com o dedo e o penetremos com o olhar, não mais pelo
raciocínio somente, porem pelos fatos. Graças às comunicações espíritas, não se
trata mais de uma simples suposição, de uma probabilidade sobre a qual cada um
conjeture à vontade, que os poetas embelezem com suas fiches, ou cumulem de
enganadoras imagens alegóricas. É a realidade que nos aparece, pois que são os
próprios seres de além-túmulo que nos vem descrever a situação em que se acham,
relatar o que fazem, facultando-nos assistir, por assim dizer, a todas as
peripécias da nova vida que lá vivem e mostrando-nos, por esse meio a sorte
inevitável que nos esta reservada, de acordo como os nossos méritos e
deméritos.
Haverá nisso alguma coisa de anti-religioso?
Muito ao contrario, porquanto os incrédulos encontram ai a fé e os tíbios a
renovação do fervor e da confiança. O Espiritismo é, pois, o mais potente
auxiliar da religião. Se ele aí está, é porque Deus o permite, e o permite para
que as nossas vacilantes esperanças se revigorem e para que sejamos
reconduzidos à senda do bem pela perspectiva do futuro."
mdb12645